Neste ano, o governo parece ter adotado uma rotina. Toda semana há um anúncio de algum programa subsidiado para supostamente incentivar a economia. Logo em seguida, é claro, há sempre uma tentativa de aumentar a carga tributária. E, para não perder esse costume, o subsídio da semana já veio — e veio logo na segunda-feira.
Ele veio no lançamento do programa de crédito subsidiado para reformas residenciais, voltado à classe média. O anúncio foi feito pelo presidente Lula, e o programa prevê juros mais baixos para famílias com renda até R$ 12.000 que desejem reformar, ampliar ou adaptar a própria casa. Os recursos virão de bancos públicos, com condições favorecidas e subsídio do Tesouro Nacional. O governo argumenta que a medida estimula o consumo, aquece a economia e melhora a qualidade da moradia.
O problema é que essa lista de iniciativas subsidiadas cresce todas as semanas, enquanto o espaço fiscal do país só encolhe e se deteriora. Nos últimos meses, tivemos uma enxurrada de políticas com características semelhantes. Podemos elencar algumas aqui, mas corremos o risco de ficar a manhã inteira. Podemos falar do Desenrola Brasil, que renegocia dívidas com subsídio público. Podemos falar do programa Mover, que concede incentivos à indústria automobilística.
O programa Pé-de-Meia, que transfere renda a estudantes; a nova faixa do Minha Casa, Minha Vida, que amplia o subsídio sobre o crédito habitacional; o programa de carros populares, que é uma renúncia fiscal para montadoras; o programa de microcrédito para empreendedores de baixa renda, que também tem taxas subsidiadas; a criação do Fundo Nacional sobre Mudanças do Clima, que também é um crédito subsidiado; o novo auxílio-gás; o programa Brasil Soberano, que serve para ajudar os exportadores brasileiros frente àquelas tarifas unilaterais dos Estados Unidos e também para proteger os da inaptidão negocial do governo brasileiro.
Temos ainda a aprovação da isenção do Imposto de Renda Pessoa Física até R$ 5.000, recentemente a gratuidade nas contas de energia elétrica e, agora, esse programa para reformar moradias populares, que terá um custo de cerca de R$ 7 bilhões. Somados, esses programas todos já representam mais de R$ 80 bilhões em subsídios — e essa conta ainda deve crescer.
Ao mesmo tempo, o governo tenta, por outro lado, aumentar a arrecadação. Podemos citar diversas medidas com essa intenção, como a reoneração gradual da folha de pagamentos, a taxação dos fundos exclusivos e offshore, a tributação de apostas eletrônicas, a tentativa de acabar com benefícios do Perse, o aumento do IOF sobre as operações de crédito às empresas, sobre operações de câmbio, sobre compras no exterior e sobre seguros de vida, o fim da isenção de tributos sobre títulos incentivados, a tributação de criptoativos e o aumento das alíquotas sobre JCP — juros sobre o capital próprio — e sobre a distribuição de dividendos.
Ou seja, temos o governo subsidiando de um lado e tributando do outro — uma espécie de jogo de soma zero que fragiliza a economia, não a fortalece. E há um agravante.
Nesse caso, não há qualquer justificativa econômica plausível para oferecer crédito subsidiado à classe média para reformar a casa própria. Não se trata de um programa de inclusão social, tampouco de combate à pobreza. Trata-se de mais uma tentativa de injetar artificialmente recursos em um setor que, embora importante, não está em crise e nem precisa de estímulo público.
O setor de materiais de construção e serviços de reforma já tem um desempenho robusto, impulsionado pela retomada do mercado imobiliário e pelo crescimento do consumo das famílias. Na prática, essa medida tende a gerar efeitos colaterais negativos, ao aquecer o comércio varejista ampliado e o setor de serviços, que já são segmentos mais resistentes à queda de preços. O programa pressiona a inflação e enfraquece a política monetária, que tenta há meses conter os preços sem travar a economia.
O crédito subsidiado, portanto, atua na contramão dos esforços do Banco Central. Em economia, não existe alquimia. Quando o governo concede crédito barato a um grupo específico, alguém paga essa conta — e esse alguém é o contribuinte, via aumento de impostos ou inflação. O subsídio não surge do nada. Ele é financiado por mais dívida pública, o que piora a situação fiscal, eleva o risco-país, encarece o crédito privado e, ironicamente, aumenta os juros para todos os demais brasileiros.
Se o governo realmente deseja reduzir o custo do crédito e ampliar o acesso a financiamentos, deveria mirar nas causas estruturais do problema, e não em paliativos populistas. É preciso manter uma política fiscal crível e superavitária, parar de estimular artificialmente a demanda e respeitar a independência da política monetária.
No campo microeconômico, a agenda correta envolve melhorar as garantias de crédito, aumentar a taxa de recuperação de dívidas, reduzir os prazos judiciais e ampliar a competição bancária. Isso, sim, reduz juros de forma duradoura, sustentável e sem truques. Enquanto insistirmos na economia da vitrine, feita de anúncios semanais e estímulos artificiais, continuaremos pagando caro por resultados passageiros. O Brasil precisa de um governo que planeje, não que improvise.