A moeda cumpre três funções essenciais: unidade de conta, meio de troca e reserva de valor. Mas, quando a inflação explode, essas funções se esfarelam. Os preços deixam de servir como referência confiável e o dinheiro perde sua utilidade como reserva de valor, já que o que se compra hoje não é mais possível comprar amanhã com a mesma quantia. É exatamente o que vem acontecendo na Venezuela.
O bolívar, corroído pela hiperinflação, deixou de cumprir seu papel básico de moeda. O resultado é que a população busca alternativas para se proteger da perda do poder de compra e garantir um mínimo de previsibilidade em suas transações do dia a dia. Nesse contexto, muitas pessoas recorrem não só ao dólar, mas também às chamadas stablecoins, criptomoedas atreladas a moedas fortes como o próprio dólar.
A escolha pelas stablecoins, em vez do papel-moeda americano, tem relação direta com a oferta e a circulação. É mais fácil movimentar recursos digitais, especialmente em um ambiente de restrição regulatória e de vigilância por parte da autoridade monetária ou do governo. Além disso, o fluxo das transações não depende da disponibilidade física de dólares em espécie, algo escasso em várias regiões da Venezuela.
Com celular e internet, a população consegue proteger parte da renda da corrosão inflacionária, usar como meio de pagamento e até enviar remessas com menor risco de apreensão.
Em economia, não existe alquimia. Quando o Estado desorganiza a moeda, o mercado encontra alternativas — ainda que imperfeitas — para preservar as trocas e o valor do trabalho das pessoas. É uma lição dura: a credibilidade da moeda não é um decreto, mas uma conquista diária da política fiscal e monetária responsável.