O Rodoanel da Região Metropolitana de Belo Horizonte é uma obra aguardada há décadas. Prometido como alternativa urgente ao saturado Anel Rodoviário da capital, ele nasceu para resolver um dos maiores gargalos urbanos do país: uma via que concentra trânsito de carga, tráfego metropolitano e acidentes em série. Seu atraso custa caro todos os dias em congestionamentos, insegurança viária e perda de eficiência logística para toda a região.
Mas, se no papel o Rodoanel é consenso, na prática divide. As notas recentes das prefeituras de Betim e Contagem expuseram de forma cristalina essa contradição.
Em Betim, o tom foi de comemoração. O prefeito Heron Guimarães lembrou que o município acompanha cada versão do projeto desde 2020: o Decreto de Utilidade Pública (DUP) de 2020 foi considerado inaceitável, o de 2024 ainda tinha imperfeições, mas com o de 2025 a cidade enxerga, pela primeira vez, uma proposta que responde às suas demandas históricas.
O novo traçado, segundo a prefeitura, inclui soluções modernas para as interseções: viadutos, passagens inferiores e barreiras acústicas para preservar a mobilidade urbana e impedir o isolamento de bairros. São oito cruzamentos projetados dentro do município, todos pensados para manter a ligação entre comunidades e compatibilizar o traçado com a futura via municipal.
Betim cita exemplos concretos: o acesso pela Adutora Várzea das Flores, que terá passagem inferior e conexão direta à Via Expressa, e a solução para a avenida Tapajós, no entroncamento da BR-262 com a BR-381. Para a prefeitura, essas adequações garantem que a cidade não será fragmentada, mas integrada ao novo eixo logístico de Minas Gerais.
Ainda restam preocupações com desapropriações e a destinação de áreas para equipamentos públicos, mas o tom final é de otimismo.
Betim entende que, agora, o Rodoanel respeita seus bairros, protege sua população e abre novas perspectivas de crescimento ordenado.
Já Contagem trilha caminho oposto. A prefeitura reforça que sempre esteve alinhada a Betim nas decisões, mas, ao contrário da vizinha, não enxerga melhorias no traçado. Para Contagem, o projeto segue sendo uma ameaça: corta a bacia de Vargem das Flores, responsável por cerca de 8% do abastecimento de água da RMBH; separa bairros, criando barreiras urbanas; e pode estimular a ocupação irregular em uma área que já hoje exige vigilância constante do poder público.
Contagem deixa claro que está disposta a dialogar, mas estabelece um limite inegociável: a preservação da bacia, recurso estratégico para toda a região metropolitana.
Fontes ligadas à prefeitura afirmam que a mudança de posição de Betim causou estranheza, já que até então as duas cidades caminhavam juntas na defesa de ajustes mais profundos no projeto.
O contraste é revelador: uma mesma obra que para Betim simboliza avanço, para Contagem significa ameaça. E assim, o Rodoanel, que deveria ser símbolo de integração e de superação do atraso viário, corre o risco de se tornar novo foco de conflito metropolitano.
A divergência mostra que o debate não pode se limitar ao traçado técnico. Trata-se de decidir se a RMBH quer enfrentar suas urgências em mobilidade, segurança viária e desenvolvimento, contemplando uma visão ambiental que entenda as necessidades de um mundo que se transforma.
Enquanto isso, o relógio da mobilidade corre. O Anel Rodoviário continua saturado, perigoso e sem alternativa à altura. E a obra que poderia trazer alívio segue parada no mesmo ponto, entre os aplausos de Betim e a resistência de Contagem.
Procurada, a Secretaria de Infraestrutura do Governo de Minas não retornou para esclarecimentos sobre as adequações no projeto que fizeram com que a Prefeitura de Betim mudasse sua posição de oposição ao Rodoanel, e sobre os questionamentos reiterados pela Prefeitura de Contagem.