A Câmara dos Deputados deve votar nesta semana o projeto que cria o Estatuto do Aprendiz, com o objetivo de dar mais segurança jurídica à Lei da Aprendizagem, ampliar a contratação de jovens e abrir caminho para até 1 milhão de novas vagas formais no país.
Para entender o impacto da proposta e os desafios do programa, a 98 News conversou com Keuri Chamse, diretora de assistência social da Rede Cidadã, uma das maiores entidades de inclusão produtiva do Brasil.
“Trazer maior estabilidade e modernizar a lei”
Keuri lembra que o programa de aprendizagem não é novo. “O programa de aprendizagem já consta da nossa Constituição. Desde 1943 já funciona no país e, em 2000, quando foi promulgada a lei 10.097, houve um avanço no número de contratações. Desde então, pude acompanhar, nesses mais de 30 anos de trabalho com inclusão produtiva, muitas mudanças e também ameaças à lei, com medidas provisórias e tentativas de redução das vagas. Nossa atenção com o Estatuto é trazer maior estabilidade e modernizar essa lei, que vai completar agora em dezembro 25 anos.”
Ela destaca que a principal mudança prevista é a simplificação do cálculo de cotas para as empresas. “Hoje a empresa é notificada pelo Ministério do Trabalho, que identifica de forma muito subjetiva a cota que ela deve cumprir. A proposta é simplificar o cálculo, o que pode abrir mais de 1 milhão de vagas, considerando também incentivos para empresas de médio porte e a adesão da administração pública, que hoje não é obrigada a contratar aprendizes.”
Combate ao apagão de mão de obra
Questionada sobre o papel do Estatuto diante da falta de trabalhadores qualificados em alguns setores, Keuri foi enfática. “Certamente. O programa já contribui para isso atualmente. Ele quebra o paradigma da resistência ao contrato CLT entre jovens da geração Z. Não é só um emprego, é uma política pública com formação e orientação técnica e comportamental. Esse jovem aprende na prática e em sala de aula, com cursos que tratam de valores, família, hierarquia, relacionamento e preparo emocional.”
Segundo ela, a vivência no programa aumenta a chance de efetivação. “Muitos são contratados ao final, já adaptados à filosofia e aos valores da empresa.”
Retorno social e econômico
Keuri reconhece as críticas ao modelo atual, considerado engessado, mas defende que a modernização prevista no PL vai flexibilizar e atualizar o programa.
“O jovem de 25 anos atrás não é o mesmo de hoje, e o mercado também mudou. Precisamos de novas disciplinas, conceitos e uma estrutura mais flexível para atender desde pequenas empresas até a administração pública.”
O impacto, afirma, não se limita ao social. “A contratação de aprendizes gera retorno econômico para a empresa, para a cidade e para o país. Movimenta a economia local e forma mão de obra qualificada.”
Olhar para o futuro em um mercado em transformação
Com mudanças rápidas no mundo do trabalho e o avanço da inteligência artificial, Keuri ressalta a importância de preparar os jovens para o presente e para o futuro.
“Não adianta falar só das profissões do futuro. Temos que atender as demandas atuais. E nem todos os jovens têm domínio de tecnologia — muitos ainda dependem do computador da escola. Trabalhamos do básico ao avançado, levando o que o mercado demanda.”
Para ela, a formação integral é essencial. “O jovem traz energia, visão diferente, é curioso e criativo. Se a inteligência artificial não vier acompanhada dessas competências, ela se torna apenas repetitiva. É essa combinação que forma profissionais preparados para o que vier.”