Depois de mais de uma década do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, as vítimas da tragédia começam, enfim, a vislumbrar que a Justiça pode estar mais próxima de ser plenamente cumprida. Em meio a um longo percurso de dor, luta e espera, familiares e atingidos classificam a condenação da mineradora BHP, em Londres, como um marco de esperança e reconhecimento.
“Hoje, para mim, o sentimento é de gratidão. Gratidão, primeiramente, a Deus, porque eu nunca perdi a fé. E Deus enviou vocês, porque, se não fosse por vocês, a gente estaria sem justiça. Hoje o sentimento é só de alegria, de gratidão. Foi a noite mais longa durante esses 10 anos”. A fala é de Gelvana Rodrigues, mãe de Thiago Damasceno, menino de 7 anos que morreu após ser arrastado pelos rejeitos.
Para ela, o desfecho representa um passo essencial no processo de reparação. “A justiça prevaleceu, e o mais importante é isso para a gente. Meu filho agora vai poder descansar em paz, porque a justiça vai ser feita (…) a vida do meu filho não tinha preço. Não estava a venda”, declarou.
O sentimento de alívio também ecoa entre os moradores de Bento Rodrigues, o distrito arrasado pela enxurrada de lama em 2015. Integrante da Comissão dos Atingidos e moradora da comunidade, Mônica dos Santos destacou que a decisão recente simboliza uma conquista histórica após anos de mobilização.
“Hoje é um momento de muita comemoração e muita alegria. São 10 anos buscando a tão sonhada justiça e 8 anos da ação inglesa. Que esse marco sirva para que a nossa Justiça brasileira aprenda, o que ela não fez nesses 10 anos”, afirmou.
Condenação da BHP
A Justiça do Reino Unido responsabilizou a BHP pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, que deixou 19 mortos e devastou o Rio Doce em 2015. A mineradora foi condenada em uma ação coletiva que representa mais de 620 mil atingidos e que pode gerar indenizações de até 36 bilhões de libras (cerca de R$ 266 bilhões).
A juíza Finola O’Farrell concluiu que a empresa atuou como poluidora direta e indireta, com base na legislação ambiental brasileira e no Código Civil, e apontou negligência, imprudência e imperícia no desastre. Segundo a decisão, havia provas claras de que a barragem era instável desde 2014, mas a BHP não tomou medidas preventivas e seguiu elevando a estrutura até o colapso.
O tribunal também rejeitou o argumento de que a BHP não controlava a Samarco, afirmando que a mineradora e a Vale exerciam comando direto sobre a operação e lucravam com ela. A decisão aumenta a pressão internacional por reparação, embora a BHP alegue que o processo no Reino Unido duplica medidas já em curso no Brasil pela Fundação Renova.
Em nota, a mineradora BHP informou que pretende recorrer da decisão da corte britânica. A empresa reforçou o compromisso com o processo de reparação no Brasil e com a implementação do Novo Acordo do Rio Doce.
“A BHP Brasil, junto à Vale e Samarco, continua empenhada na implementação do acordo firmado em outubro de 2024, o qual assegurou um total de 170 bilhões de reais para os processos de reparação e compensação em curso no Brasil”, informou.
