O deputado federal Léo Motta (PSL-MG) indicou, entre 2019 e 2020, cerca de R$ 1 milhão em emendas parlamentares a uma associação ligada a aliados políticos e à sua mulher. A verba seria repassada a uma entidade de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, vinculada a membros do Democracia Cristã (DC), cujo diretório municipal na cidade é controlado por sua esposa.
Os recursos indicados não foram pagos integralmente à entidade devido a falta de documentação obrigatória por lei, mas a associação chegou a receber R$ 1,1 milhão através do Fundo Municipal de Assistência Social de Contagem – destino de parte das emendas indicadas pelo deputado, além de R$ 413 mil em emendas parlamentares enviadas por Léo Motta na época em que o parlamentar era vereador da cidade, em 2018.
A Associação Comunitária Shekinah, localizada no bairro Industrial, tem estrutura modesta, divide seu espaço com outras lojas e não tem identificação clara – há apenas um adesivo pequeno, próximo ao interfone, com o nome Shekinah, além de adesivos eleitorais da ex-candidata a vereadora de Contagem Fatinha do Manancial. Segundo comerciantes vizinhos, a entidade não abre desde o início da pandemia da Covid-19, em março de 2020. A reportagem da 98 visitou o endereço da associação durante duas semanas e não viu movimentações no local.
(Fachada da Associação Shekinah – no detalhe, a placa de identificação | Foto: Léo Fontes / 98 Live)
Criada em 1997, segundo dados da Receita Federal, a Associação Comunitária Shekinah tem o objetivo de desenvolver “ações de promoção e fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários dos idosos e famílias em situação de vulnerabilidade social”. O atual presidente da instituição é o empresário Marco Antônio Moreira, conhecido como “Macarrão”, cunhado do ex-vereador de Contagem Professor Carlinhos e casado com a ex-candidata a vereadora Fatinha do Manancial (DC).
Fatinha foi candidata em 2020 à uma cadeira na Câmara Municipal de Contagem, mas não conseguiu se eleger. Ela disputou o pleito pelo Democracia Cristã, mesmo partido do vereador Abner Motta (DC), filho do deputado Léo Motta, e cujo diretório municipal é presidido pela esposa do deputado, Andreia Carmo. As coincidências não param por aí: o tesoureiro-geral do diretório do DC de Contagem e o secretário-geral do partido na cidade são assessores nomeados no gabinete do deputado em Brasília. No registro do partido no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o telefone de contato do DC em Contagem é o mesmo número de celular publicizado por Léo Motta em suas redes sociais.
(Página da Associação Shekinah no Facebook; na aba ‘sobre’, nenhuma informação sobre a instituição)
R$ 414 mil em emendas
Em 2018, quando ainda era vereador de Contagem, Léo Motta chegou a indicar emendas parlamentares da Câmara Municipal para a mesma associação. Os repasses só aconteceram em 2019, quando ele assumiu o mandato como deputado federal. Por intermédio de Motta, foram repassados R$413.529,60 à associação Shekinah entre junho de 2019 e abril de 2020 (acesse aqui o documento na íntegra, disponível no site da Câmara dos Deputados).
Já como deputado federal, Motta indicou por cinco vezes o repasse por emendas parlamentares à associação, mas a entidade não possuía, na época, cadastro no Conselho Municipal de Assistência Social (Cnaes), e por isso não poderia receber o recurso. Por conta disso, o deputado repassou a verba ao Fundo Municipal de Assistência Social de Contagem – o mesmo que, meses depois, repassou recursos à Shekinah.
(Pedido de Emenda parlamentar no valor de R$ 700 mil, assinada pelo Deputado Federal Leo Motta e destinado à Associação Shekinah)
“Nada a esconder”, diz Deputado
Questionado pela reportagem, o deputado federal afirmou que as indicações de emenda parlamentar à associação, feitas enquanto parlamentar da Câmara dos Deputados, não se efetivaram “haja vista não terem cumprido os requisitos na forma da lei. Cabe, ainda, destacar que as respectivas emendas foram remanejadas para a saúde. O Deputado Léo Motta preza pela transparência e não tem nada a esconder“, diz a nota.
Sobre as ligações entre a associação e o partido político, o parlamentar afirmou que se tratam de duas instituições distintas e que não há conflito de interesses. “Fatinha, que foi candidata a vereadora em 2020, é filiada ao DC desde 2012, quando foi candidata, sem que eu tenha com ela vínculos de qualquer natureza. Meu grupo político passou a construir relações com o DC apenas em 2016, mas em 2018 fui candidato pelo PSL e apenas a partir de 2020 passou a estar à frente do Partido, ocasião em que Fatinha voltou a ser candidata. Fora isso, o resto não passa de ilação“, disse.
Em entrevista ao Central 98 desta quarta-feira (16), Léo Motta afirmou que as relações apontadas pela reportagem são parte do meio político. “Não tem jeito de desassociar o contexto social. Sou nascido e criado em Contagem, deputado majoritário desta cidade e tenho relações políticas amplas nesta cidade. A relação das entidades partido e associação não têm pertinência”, afirmou. (Veja a íntegra da entrevista abaixo)