Dedicado o dia para conversas com políticos, faço aqui um resumo do que apurei junto ao PL, e com apoiadores do ex-presidente Bolsonaro.
O Partido Liberal vive um paradoxo que é, ao mesmo tempo, estratégico e existencial: como manter a coesão de um projeto político que gira em torno de um líder ameaçado por decisões judiciais e sem horizonte institucional claro? O ex-presidente Jair Bolsonaro, mesmo inelegível, ainda é o principal fiador da direita conservadora, e sua sombra paira sobre cada passo do partido.
Nos bastidores da Câmara, onde cerca de 50 parlamentares bolsonaristas se reuniram recentemente para protestar contra medidas do STF, a aposta já está feita: Bolsonaro teria sinalizado apoio ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como o nome para disputar a Presidência da República em 2026. A escolha, embora informal, é sintomática. Tarcísio reúne atributos que agradam o eleitorado conservador, disciplina, origem militar, gestão técnica, e tem a vantagem de já ocupar um cargo de visibilidade nacional. Mas há obstáculos internos.
Tarciso e o PL: uma relação pouco amistosa
Tarcísio não é “da casa”. A relação com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, nunca foi fluida. Há desconfiança de ambos os lados. Tarcísio, pragmático, mantém distância do bolsonarismo raiz e flerta com um discurso mais palatável ao centro. No entanto, ninguém dentro do PL parece disposto a confrontar Bolsonaro, mesmo quando ele escolhe um nome que o partido ainda não digeriu por completo.
Outra peça delicada nesse xadrez é a família Bolsonaro. A decisão de não indicar nenhum parente direto, nem Flávio, nem Eduardo, tampouco Michelle, revela o temor de colocar um nome da linhagem direta na disputa e vê-lo terminar a eleição sem mandato e, portanto, sem foro privilegiado. Michelle segue como uma carta curinga, com boas chances ao Senado por Brasília, mas fora do tabuleiro presidencial.
Enquanto isso, Eduardo Bolsonaro ensaia seu retorno ao jogo. Reativou seu mandato na Câmara sem alarde, após quatro meses de licença, evitando acúmulo de faltas que poderiam comprometer seu futuro parlamentar. Ainda que ausente fisicamente, seu gesto sinaliza um instinto de preservação. A base bolsonarista está se preparando para o pior: há no ar a expectativa da prisão do ex-presidente, e uma possível substituição simbólica ou direta no papel de liderança do movimento.
Internamente, a bancada bolsonarista do PL está rachada. A velha pauta da anistia deve voltar à cena no segundo semestre, mas com fôlego limitado. Metade da bancada vai engrossar o coro, a outra metade, mais pragmática e centrada nos acordos com o governo e o Centrão, vai simplesmente fingir que não ouviu. É o retrato de um partido dividido entre o instinto ideológico e a sobrevivência institucional.
Adicione-se a isso o desgaste da relação com o presidente da Câmara, Arthur Lira, e agora com Hugo Motta, que proibiu o uso de comissões para manifestações em favor de Bolsonaro. O gesto foi lido como um erro político grave, e há quem já risque Motta do tabuleiro de 2027.
O PL vive, portanto, uma crise de sucessão antecipada. Seu principal ativo político está inelegível, cercado de processos e, segundo aliados, a caminho de ser preso. O herdeiro escolhido não empolga a militância e não tem base interna consolidada. A família Bolsonaro, por ora, recua taticamente. E o partido caminha para 2026 com mais perguntas do que respostas, entre elas, a mais importante: quem lidera a direita pós-Bolsonaro?