A municipalização do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, oficializada com direito a cerimônia, discursos e palmas, é vendida como a realização de um “sonho de 40 anos”.
O prefeito Álvaro Damião (União Brasil), ao lado do ministro Renan Filho, assina a transferência com ares de conquista histórica. Um acordo desenhado pelo prefeito Fuad Noman. De fato, não é pouca coisa assumir os 26,2 km de uma via que mais parece um corredor de tragédias. Só em manchetes, o Anel coleciona mais vítimas do que boas notícias.
Não basta mudar a placa de “propriedade” da rodovia. Transferência sem transformação não salva vidas. O verdadeiro desafio da Prefeitura de Belo Horizonte não é assinar um papel bonito, mas fazer uma gestão eficiente, com planejamento técnico, execução célere e, principalmente, com prestação de contas à altura da gravidade que a via representa.
A Avenida da Morte
O Anel Rodoviário é um dos principais corredores viários da capital mineira, com um fluxo diário de mais de 160 mil veículos, incluindo uma significativa proporção de veículos pesados. Essa intensa movimentação contribui para a elevada taxa de acidentes na via. Em 2024, foram registrados 708 acidentes, colocando o Anel no topo do ranking de ocorrências na cidade.
A letalidade também é alarmante. Em 2024, 31 pessoas perderam a vida em acidentes no Anel Rodoviário, superando os 29 óbitos registrados em todo o ano de 2023. Isso equivale a uma morte a cada 850 metros da via, destacando a gravidade da situação.
Há R$ 110 milhões prometidos pelo governo federal. Um valor expressivo, mas que evapora facilmente se cair na velha armadilha da burocracia, das obras eternas e das licitações que levam mais tempo do que o asfaltamento de Marte. Construir dois viadutos e revitalizar uma via inteira é só o começo. O fundamental é que a PBH compreenda que não herdou apenas concreto e asfalto: herdou uma responsabilidade social e moral.
Porque o Anel Rodoviário não é só uma rodovia, é uma avenida urbana onde famílias perderam entes queridos e a população já perdeu a esperança. A gestão municipal agora tem a chance de inverter essa lógica, mas tem que ser mais eficiente e menos com discursos e solenidades. Com engenharia de verdade. Com fiscalização, sinalização, inteligência de tráfego. E, se possível, sem mais desculpas.