A fila sempre foi vista como símbolo de atraso, espera inútil, burocracia. Mas, nas mãos certas, virou um espetáculo de branding. Se você já passou em frente a uma Apple Store no dia de lançamento ou ouviu falar de jovens acampando semanas antes de um show da Taylor Swift, sabe do que estou falando. A fila deixou de ser apenas um problema e se tornou narrativa.
Estar na fila, para muita gente, é mais do que comprar um ingresso ou segurar uma sacola — é participar de um ritual coletivo de desejo. A fila cria comunidade instantânea. Pessoas que nunca se viram dividem comida, trocam histórias, compartilham memes. No meio da espera, nasce a sensação de fazer parte de algo maior. O pertencimento não é consequência da compra, é consequência da fila.
E aqui está o detalhe perverso: esse acaso que antes era acidental agora é cuidadosamente projetado. Algumas marcas orquestram filas como parte da estratégia. Lançam produtos em drops limitados, geram rumores de escassez e transformam a espera em espetáculo. Nada legitima mais o valor de algo do que a imagem de pessoas sacrificando horas — ou dias — para tê-lo. A espera se converte em credencial social.
Esse mecanismo é tão poderoso que até eventos políticos e culturais já se apropriaram dele. Da posse de líderes mundiais a feiras de tecnologia, o “eu estive na fila” virou prova de status, narrativa pessoal e postagem obrigatória no feed. O branding da fila, no fundo, não é sobre o produto, é sobre a construção de memória. Estar lá é ser parte de uma história que só acontece uma vez — e as marcas sabem disso.
O consumidor não compra só o que está no fim da fila, ele compra o direito de contar que esperou. O tempo vira capital simbólico, a paciência vira pertencimento. A fila é a encenação do desejo coletivo, e poucas coisas são mais poderosas para uma marca do que ver sua comunidade disposta a transformar horas de espera em um espetáculo público de devoção.