Há lugares que não são apenas paredes, mesas e cadeiras. São guardiões da memória coletiva, cofres invisíveis onde a cidade deposita fragmentos de sua alma. O Café Nice, inaugurado em 1939, é um desses espaços. Ele não serve apenas café, serve encontros, risos, debates acalorados. O Nice foi palco e plateia de uma Belo Horizonte que, ainda jovem, aprendia a se reconhecer como capital.
Com o passar das décadas, o centro da cidade foi mudando de feição. Os escritórios, sedes de bancos, mudaram seus endereços, o comércio popular tomou o lugar das livrarias elegantes, os novos bairros drenaram o movimento que antes pulsava nas ruas do centro. O Nice, testemunha silenciosa, foi perdendo protagonismo. Ficou ali, quase como um retrato esquecido na estante, lembrando-nos de que a cidade já tivera outros tempos, outras conversas, outros sons.
Mas a história, como o bom café, tem o dom de se reinventar. Hoje, o Café Nice renasce, repaginado, abrindo suas portas como quem abre os braços para um reencontro. Não é apenas a reinauguração de um espaço físico, é o reavivar de uma chama que parecia adormecida. É um convite para que a cidade volte a se reconhecer no espelho do seu próprio centro.
Ao atravessar suas portas, não estamos apenas entrando em um café: estamos cruzando um portal para o passado e, ao mesmo tempo, para o futuro. Cada mesa ali carrega a promessa de novas histórias; cada xícara servida carrega o sabor da memória. E talvez seja disso que Belo Horizonte precise neste momento: reencontrar-se consigo mesma, resgatar sua alma de convivência, recuperar a poesia que o ritmo apressado tentou calar.
Que a reinauguração do Nice não seja apenas um evento isolado, mas o símbolo de um desejo coletivo: ocupar novamente o centro, conviver com a cidade, devolver-lhe o calor humano que os anos tentaram dispersar.
Porque uma cidade não vive só de prédios, avenidas e obras. Vive de encontros. Vive de olhares. Vive de cafés como o Nice — eternos pontos de partida e chegada.
E assim, entre memórias e esperanças, Belo Horizonte prova mais uma vez que o coração da cidade pode, sim, voltar a bater com força. Basta que o café esteja quente, as portas abertas e a vida disposta a se reencontrar.