Imagine uma obra no encanamento de casa: começa com a troca de uma torneira, mas logo vira uma reforma que derruba paredes, muda o piso da sala e termina com um orçamento que ninguém previu. É mais ou menos assim que a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) enxerga a proposta de reforma do Código Civil em tramitação no Congresso.
A entidade, junto a outras 14 organizações da sociedade civil, lançou um alerta: a reforma, do jeito que está, pode trazer mais confusão do que solução. Com mais de 1.200 artigos sendo revistos de uma só vez, a preocupação é com o que eles chamam de insegurança jurídica, avalanche de processos e, no limite, até quebra de empresas, especialmente as pequenas, que são sempre as primeiras a sentir o baque.
A Fiemg dá a letra
Flávio Roscoe, presidente da Fiemg, não poupou palavras: “Estão propondo dar ao Judiciário a possibilidade de revisar praticamente todos os contratos existentes, em nome de uma função social que ninguém sabe exatamente o que é”. Para ele, o cenário é de caos, com contratos instáveis, empresários na defensiva e um Judiciário ainda mais sobrecarregado.
E há um ponto que merece atenção: a proposta estaria cheia de conceitos jurídicos “abertos”, que parecem ótimos na teoria, mas, na prática, viram terreno fértil para interpretações e disputas sem fim.
A Fiemg ainda levanta um ponto sensível: a ampliação da responsabilidade civil das empresas, mesmo quando elas seguem a lei. Um peso extra especialmente cruel para os pequenos empresários, que terão que gastar mais com advogados ou se preparar para enfrentar ações judiciais frequentes. Algo que, convenhamos, não combina com um ambiente favorável a negócios.
No centro da crítica está a forma como tudo vem sendo conduzido. Segundo Roscoe, a reforma foi gestada quase exclusivamente por operadores do direito, sem escutar quem movimenta a economia real. “Não teve análise econômica. Mudar o Código Civil nessa escala exige uma discussão ampla e responsável”, resume ele.
Não se trata de negar a necessidade de modernizar a legislação; aliás, o Código atual é de 2002 e tem suas defasagens. Mas fazer isso sem ouvir o setor produtivo é como redesenhar uma avenida sem consultar quem dirige por ela todos os dias.
O debate está aberto, as decisões podem vir de cima para baixo, por isso é bom combinar com os donos da lojinha da esquina.