Belo Horizonte tem vivido um abandono silencioso. Não falo apenas da falta de investimentos ou das calçadas esburacadas. Falo dos carros largados, esquecidos nas ruas, que mais parecem feridas abertas no tecido urbano da cidade. Estão ali – enferrujando, acumulando lixo, servindo de abrigo para o crime e para o descaso.
E nós? Seguimos passando por eles como se fossem parte da paisagem.
É impossível andar por BH sem cruzar com pelo menos um desses veículos fantasmas. São carros sem placas, com pneus arriados, cobertos de poeira ou mato crescendo ao redor. Estão em bairros nobres, populares, no centro e na periferia. São sinais claros de que algo está fora do lugar — e ninguém parece se importar.
A prefeitura até tem um protocolo para remoção de veículos abandonados. Mas ele é lento, engessado, burocrático. Enquanto isso, os carros ficam nas ruas e avenidas da cidade. Viram criadouros de dengue, criam insegurança e ocupam vagas públicas como se as ruas fossem pátios particulares. E o pior: se tornam símbolo da indiferença. Porque ninguém abandona um carro na rua por engano. É uma decisão consciente, e covarde.
Falta fiscalização, sim. Mas falta também um senso coletivo de responsabilidade. Falta entender que a rua é de todos, e que cuidar da cidade vai além do que está dentro do nosso portão. Abandonar um carro em via pública é, antes de tudo, um ato de desrespeito — com o vizinho, com o pedestre, com a cidade inteira.
BH precisa reagir. Precisamos de mais agilidade nas remoções, de leis mais rígidas, mas também de uma postura mais crítica da população. Denunciar, cobrar, questionar. A cidade não pode continuar sendo depósito de sucata. Precisamos parar de normalizar o abandono. Porque quando aceitamos esse tipo de descuido, aceitamos viver num lugar onde o abandono virou regra. E uma cidade assim não tem futuro. Só ferrugem.