No momento em que os olhos do mundo se voltam para o Brasil durante a Cop 30, uma decisão da Justiça do Trabalho chama atenção para um problema ambiental e de saúde pública pouco visível: a contaminação gerada por cemitérios e os riscos para quem trabalha nesses locais.
O processo, envolvendo um trabalhador que atuou em dois cemitérios de Belo Horizonte, resultou na manutenção da condenação da empresa ao pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, equivalente a 40 por cento.
Decisão da Justiça do Trabalho em BH
Em primeiro grau, a 26ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte reconheceu o direito ao adicional de insalubridade diante da exposição do empregado a risco biológico nas atividades exercidas. A empresa recorreu, mas os julgadores da Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais negaram provimento ao recurso em sessão realizada em 13 de maio de 2025.
O trabalhador realizava capina, roçado mecânico, recolhimento de coroas, oferendas e resíduos nas quadras dos jazigos, além de transferir o lixo dos velórios. De acordo com o laudo técnico, ele recolhia resíduos presentes nas quadras, como restos de metais, trapos e outros materiais provenientes da abertura de covas, manuseando esse lixo sem comprovação adequada de fornecimento e troca de Equipamentos de Proteção Individual.
Na decisão, a desembargadora relatora Maria Raquel Ferraz Zagari Valentim destacou que a insalubridade por agentes biológicos é inerente a esse tipo de atividade e não é neutralizada pelo uso de EPIs, que apenas minimizam o risco. A ausência de controle sobre o fornecimento dos equipamentos pela empregadora reforçou a condenação e garantiu ao trabalhador a compensação pelo exercício da função em condições de risco extremo.
Cemitérios como fonte de contaminação silenciosa
O laudo pericial anexado ao processo vai além da situação individual e faz um alerta ambiental. O documento classifica os cemitérios como um aterro sanitário de material biológico que pode carregar microrganismos patogênicos.
Com base em literatura científica, a perícia aponta que a poluição causada pelos cemitérios é assintomática para a percepção sensorial da população, ocorrendo de forma silenciosa e contínua.
O ponto central do alerta é que a microbiota da terra dos cemitérios, contaminada por microrganismos patogênicos, pode ser fonte e veículo de transmissão de doenças. Esse cenário representa risco permanente à saúde pública e ao meio ambiente, especialmente ao solo e, em potencial, às águas subterrâneas.
Relação com a agenda ambiental e a COP30
A preocupação com a gestão de resíduos biológicos em cemitérios ganhou destaque durante a pandemia de Covid 19. Naquele período, a Comissão do Meio Ambiente do Conselho Nacional do Ministério Público divulgou notas técnicas sobre o manejo de corpos e o risco de sepultamentos em valas comuns ou rasas.
Ao reconhecer o risco biológico a que está exposto o trabalhador de cemitério, a decisão da Justiça do Trabalho reforça, de forma indireta, a necessidade de práticas mais rígidas de gestão ambiental no setor funerário.
A manutenção da condenação em grau máximo de insalubridade corrige uma dívida trabalhista com o empregado e, ao mesmo tempo, envia um recado à sociedade e aos órgãos reguladores. O caso evidencia que proteção à saúde do trabalhador e controle ambiental em cemitérios fazem parte do mesmo debate sobre saneamento urbano e sustentabilidade.
No mês em que o Brasil sedia discussões globais sobre sustentabilidade e mudanças climáticas, o processo funciona como lembrete de que a agenda verde precisa incluir o manejo seguro de resíduos biológicos e a proteção de quem atua em áreas essenciais e frequentemente invisíveis da infraestrutura das cidades.
Com TRT-MG
