Com a despedida de Teuda Bara, ícone do Grupo Galpão e das artes, fãs, amigos e admiradores começaram a relembrar a trajetória da artista. Em uma de suas entrevistas mais marcantes, no programa Papo com Elias, de Elias Santos, Teuda desfilou histórias com a mesma irreverência que levava aos palcos. A entrevista revela uma trajetória que mistura política, humor e uma entrega visceral à cena. Relembre os principais pontos e assista!
‘Chacrete’ comunista
O convite de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, para que ela fosse uma de suas chacretes em pleno regime militar, tornou-se uma de suas anedotas mais famosas. Teuda relembrou que, na época, cursava Ciências Sociais na Fafich e estava na plateia de uma palestra do “Velho Guerreiro”. Após o evento, em uma mesa de bar, ele fez a proposta, e ela respondeu com franqueza: “Sou comunista demais para ser chacrete”. Para Teuda, o convite era impensável: “Eu não ia de jeito nenhum”.
O tédio acadêmico e as primeiras cenas
A transição para o teatro aconteceu como um refúgio da “chatura” da linguagem acadêmica. Teuda confessou: “Tava estudando ciências sociais e de saco cheio com aquela linguagem teórica… ética protestante o espírito capitalista o livro do merda meu Deus”.
Para fugir da teoria, ela começou a improvisar cenas nos corredores da faculdade. Em uma das intervenções, ela se vestiu de mendiga para atuar dentro das salas de aula: “Os professores adoravam”. Pouco depois, decidiu largar a faculdade para se dedicar integralmente à arte: “Vou sair disso aqui. Larguei a faculdade e falei: Vou fazer teatro”.
Nascimento do Grupo Galpão
O Galpão surgiu sob a influência de diretores alemães que trouxeram métodos rigorosos para Belo Horizonte. Teuda recordou que a filosofia era de exaustão: “Eles falavam que o corpo só tá pronto para criar quando ele tá exausto”.
Na primeira peça de rua do grupo, a proposta era que Teuda fosse a noiva, mas o figurino de um baú antigo impôs outra realidade: “O vestido não cabia… aí eu virei o pai da noiva botei bigode cartola”. O grupo aprendeu técnicas circenses e de rua na prática: “Começam a ensinar pra gente técnica de teatro de rua, andar de perna de pau, soprar fogo”.
Experiência no Cirque du Soleil
Após o sucesso internacional de Romeu e Julieta, onde interpretava a Ama — personagem que ela amava por se considerar uma pessoa “romântica” —, Teuda foi convidada para o Cirque du Soleil. Na audição, ela manteve sua autenticidade frente aos atletas olímpicos: “Fiz tudo que vocês pediram… aquela uma estrela muito da safada mas é o que eu dou conta”.
Durante dois anos e meio em Las Vegas, ela enfrentou o medo das alturas: “Eu tive [medo], mas eu tinha que vencer esse medo”. Ela subia a sete metros de altura carregando dois peixes cenográficos, presa por um cabo fino: “Subia por um cordão que era da grossura de um cadarço… mas era de aço”.
Visão sobre envelhecimento e sociedade
Teuda sempre foi uma voz ativa contra padrões estéticos e a favor da liberdade. Sobre procedimentos de beleza, foi enfática: “Não quero não… minhas cicatrizes são minhas e eu quero ter minhas rugas”. Ela criticava duramente a chamada harmonização facial: “Desarmonização facial, isso não é harmonização… aquilo vai nem que me pagar caro”.
Sobre o envelhecimento e a acessibilidade, ela relatou as dificuldades de mobilidade que enfrentava: “Se eu subir uma escada… eu tenho que subir da cadeira de roda três quatro pessoas para subir a escadaria comigo porque não tem elevador”. Por vezes, confessou sentir-se um fardo pela falta de estrutura urbana: “A gente fica parecendo um peso pra sociedade… eu tô me sentindo um peso”.
Política e o ‘Coffee Shop da Savassi’
Defensora da legalização da maconha, tanto para uso medicinal quanto industrial, ela imaginava um futuro empreendedor em Belo Horizonte: “Se legalizasse eu ia abrir um cof shop da Savassi, empreendedora, ia ficar lá fumando e enrolando e vendendo e contando os casos”. Para ela, a planta é injustamente condenada: “É uma planta maravilhosa que eles condenam… por bobagem”.
Teuda Bara encerrou a entrevista reafirmando sua fé, uma crença na força superior e na conexão com a arte que a manteve vibrante até o fim.
