A Justiça do Trabalho condenou uma igreja evangélica de Belo Horizonte a pagar R$ 95 mil de indenização por danos morais a um ex-pastor que foi obrigado a realizar uma vasectomia para permanecer na função. A decisão também reconheceu o vínculo de emprego entre as partes e determinou o pagamento das verbas rescisórias.
O ex-pastor relatou ter sido coagido a se submeter ao procedimento antes de completar 30 anos, sob ameaça de punição por indisciplina. “Isso revela a intervenção da igreja na vida privada e caracteriza dano moral indenizável”, afirmou na ação.
Duas testemunhas, ambas pastores, confirmaram que a vasectomia era exigida. Uma delas disse ter feito a cirurgia para evitar ser rebaixado para pastor auxiliar e afirmou que a prática era imposta a todos os pastores solteiros três meses antes do casamento. Segundo o depoimento, a igreja custeava o procedimento, pagando cerca de R$ 700 a um clínico geral.
O desembargador Antônio Gomes de Vasconcelos, relator na 11ª Turma do TRT-MG, destacou que o exame médico anexado ao processo, que apontou azoospermia (ausência de espermatozoides), é prova suficiente da realização da vasectomia. Para ele, ficou comprovado o ato ilícito da igreja ao determinar uma esterilização cirúrgica como condição para o exercício das funções pastorais.
Ao fixar o valor da indenização, o relator afirmou que o montante de R$ 95 mil é proporcional à gravidade do caso, que envolve violação de direitos constitucionais, como o planejamento familiar e a autonomia individual. “Exigir a vasectomia implica domínio do corpo do trabalhador, privando-o da liberdade sobre a vida pessoal e seus projetos”, registrou.
A Turma acompanhou o voto do relator e reformou a sentença da 10ª Vara do Trabalho apenas para majorar o valor indenizatório.
Vínculo de emprego reconhecido
Além da indenização, o TRT-MG manteve o reconhecimento do vínculo empregatício entre o pastor e a igreja. A instituição alegou que a atividade exercida tinha caráter exclusivamente religioso e não gerava relação de emprego.
O relator, porém, salientou que o pastor atuou de forma permanente, remunerada e subordinada, o que descaracteriza dedicação meramente voluntária ou religiosa. O autor foi contratado em 25 de janeiro de 2005, com salário mensal de R$ 3.200, e pediu demissão em 18 de setembro de 2019.
Uma testemunha que trabalhou como pastor na mesma igreja entre 2002 e 2019 relatou que havia hierarquia clara e ordens diretas a serem cumpridas, inclusive durante período em que ambos atuaram no México. Segundo ela, as tarefas incluíam evangelização nas ruas, distribuição de materiais, captação de fiéis, participação em reuniões, recolhimento de ofertas e posterior depósito bancário. “O pastor tinha que fazer tudo e resolver todas as questões da igreja”, afirmou.
Diante das evidências, a 11ª Turma rejeitou o recurso da igreja e manteve o reconhecimento da relação de emprego.
Com TRT–MG
