BRF é condenada a indenizar funcionária que perdeu bebês gêmeas ao dar à luz em frigorífico

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A sentença é da 2ª Vara do Trabalho de Lucas do Rio Verde (Google Street View/Reprodução)

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A BRF, empresa do setor alimentício, foi condenada a indenizar uma funcionária que estava grávida em R$ 150 mil por omissão e negligência. A mulher entrou em trabalho de parto durante o expediente e perdeu as filhas gêmeas na portaria um frigorífico da empresa, no Mato Grosso.

A sentença é da 2ª Vara do Trabalho de Lucas do Rio Verde (MT). O caso aconteceu em abril de 2024, quando a trabalhadora, grávida de oito meses, começou a se sentir mal no início da jornada, às 3h40.

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Com dores intensas, ânsia de vômito, tontura e falta de ar, ela buscou socorro junto à sua líder imediata e ao supervisor. Mesmo após insistentes pedidos, foi impedida de deixar o setor devido ao funcionamento da linha de produção.

Pouco depois, com o agravamento do quadro, dirigiu-se ao supervisor pela última vez e, sem conseguir esperar mais, deixou a linha de trabalho. Sentou-se em um banco no ponto de ônibus na entrada da empresa, à espera de condução para ir ao médico. No entanto, já estava em trabalho de parto: sua primeira filha nasceu na portaria da empresa, por volta das 6h30, e faleceu em seguida. Minutos depois, o mesmo ocorreu com a segunda gêmea.

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A defesa da BRF alegou que o parto ocorreu fora de suas instalações, em área pública. Também afirmou que a trabalhadora recusou atendimento pelo setor médico da empresa e que não havia registro de gravidez de risco. Sustentou, ainda, que a negligência foi da própria empregada, argumentando que trabalho de parto dura entre 8 e 12 horas.

A Rede 98 procurou a BRF, por meio da assessoria de imprensa, e aguarda o retorno. Tão logo a empresa se manifeste, esta matéria será atualizada.

Empresa teria agido com negligência

Testemunhas relataram que a gestante buscou apoio de colegas e chefes imediatos, mas não teve acesso ao Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), conforme prevê a normativa interna da empresa.

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O enfermeiro responsável pela área médica confirmou que o protocolo de atendimento não foi seguido. Depoimento da representante do frigorífico também confirmou que nem o líder, o supervisor e nem a secretária entraram em contato com o serviço médico, apesar de haver norma da empresa para casos de incidentes.

Ao julgar o caso, o juiz Fernando Galisteu afirmou não ser crível supor que a trabalhadora “nas condições debilitadas em que estava, e no oitavo mês de gestação de gêmeas, se negaria a ir ao centro médico da ré, como pretende a defesa”, complementando que no depoimento ela reafirmou ter pedido atendimento médico.

Também contrariando a defesa, a técnica de saúde que atuava no frigorífico no dia do ocorrido afirmou na audiência que “não recebeu nenhuma ligação da portaria para ser informada sobre a situação” e o enfermeiro da empresa relatou que no prontuário da trabalhadora consta o exame admissional e outros resultados de consultas de saúde. Porém, a empresa juntou ao processo apenas o exame admissional, alegando que não constavam no serviço médico, exames ou atendimentos relativos à gestação da empregada.

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Parto ocorreu nas dependências da empresa

As gravações das câmeras internas da empresa, juntadas ao processo pela própria defesa, mostram que o parto ocorreu nas dependências do frigorífico. A representante da empresa confirmou em depoimento que a técnica de enfermagem acompanhou a funcionária na ambulância e que a médica do trabalho foi chamada posteriormente ao hospital para prestar atendimento.

“A autora pediu ajuda. Estava em sofrimento evidente e no oitavo mês de gestação de gêmeas”, pontuou o juiz Fernando Galisteu na sentença. Ele concluiu que a empresa agiu com omissão e negligência ao não garantir atendimento médico com a necessária celeridade.

Testemunha indicada pela empresa afirmou que havia cadeiras no setor onde a autora trabalhava, mas que seu uso era feito por rodízio, sem prioridade para gestantes. A sentença também destacou que a unidade produtiva emprega centenas de trabalhadores e conta com veículo para emergências, mas que não foi acionado.

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O juiz salientou, ainda que mesmo se considerada a informação apresentada pela empresa de que o trabalho de parto teria demorado 3 horas, ainda assim houve tempo suficiente para disponibilizar atendimento médico adequado, o que não ocorreu.

Protocolo antidiscriminatório

A sentença também aplicou diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, interseccional e Inclusiva, elaborado pelo TST sob inspiração do Protocolo com Perspectiva de Gênero do CNJ e alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

O juiz ressaltou que a autora é imigrante, mulher e gestante, reunindo camadas de vulnerabilidade que exigem do empregador maior diligência. O magistrado citou também a Constituição e tratados internacionais como as convenções 155 e 187 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“As normas relativas à saúde e segurança no trabalho são de ordem pública, de indisponibilidade absoluta, e, portanto, de observância indispensável pelo empregador, o que deve ser observado com absoluta prioridade”, afirmou.

O dano moral, concluiu o juiz, é evidente nesse caso. “Trata-se de ofensa de natureza gravíssima, com intensidade de sofrimento e humilhação inegáveis”, escreveu o juiz ao fundamentar o valor da indenização em R$ 150 mil. Ao fixar o montante, levou-se em conta também a exposição da trabalhadora a sofrimento físico e emocional extremo, em local público, à vista de colegas, e a ampla repercussão do caso na imprensa.

Rescisão indireta

Por fim, o juiz reconheceu que a omissão da empresa tornou insustentável a manutenção do vínculo empregatício, caracterizando a rescisão indireta do contrato. Com isso, a trabalhadora terá direito ao pagamento de aviso-prévio, 13º salário, férias, FGTS com multa de 40% e acesso ao seguro-desemprego.

O juiz rejeitou a tese da empresa que apontou abandono de emprego da trabalhadora após o período de licença-maternidade. “A grave e injustificável omissão da ré é suficiente para tornar insuportável a manutenção do vínculo, caracterizando a justa causa patronal”, concluiu.

Com TRT

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Larissa Reis

Graduada em jornalismo pela UFMG e repórter da Rede 98 desde 2024. Vencedora do 13° Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão, idealizado pelo Instituto Vladimir Herzog. Também participou de reportagens premiadas pela CDL/BH em 2022 (2º lugar) e em 2024 (1º lugar).

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