Minas Gerais concentra quase 40% dos produtores de cachaça do Brasil. É líder nacional na produção artesanal, no marketing, na formulação de políticas públicas e na preservação cultural da bebida. Desde 2007, a cachaça é reconhecida por lei como patrimônio cultural do estado. E a cada nova edição da Expocachaça, esse papel histórico ganha força e visibilidade.
“A cachaça sempre foi tradicional em Minas. O estado sempre liderou, não só na produção. Sempre saiu na frente no marketing, na política, em todos os aspectos. E isso já faz muito tempo”, afirma José Lúcio Mendes Ferreira, idealizador do evento.
A 32ª edição da Expocachaça será realizada entre os dias 7 e 9 de agosto, no CenterMinas Expo, em Belo Horizonte. A programação inclui ainda o Brasil Beer, voltado para cervejas especiais, e o Minas Mais Doce, dedicado à produção mineira de doces, azeites e licores.
Valor agregado e mercado interno
Segundo José Lúcio, a cachaça de alambique representa um segmento com grande valor cultural e econômico, mas que ainda encontra desafios para crescer no mercado externo.
“Trabalhamos com cachaça de alambique. Brigamos muito para conseguir colocar isso em destaque. Porque temos dois processos produtivos. A cachaça de coluna ou industrial, feita por grandes indústrias, e a cachaça de alambique, feita pelos pequenos. Quando você compara, é gritante. A maior indústria faz 300 milhões de litros. Nós estamos falando de produtores que fazem de 50 a 200 mil litros por ano.”
Apesar da qualidade reconhecida e dos prêmios internacionais, 99 por cento do consumo da cachaça mineira é interno.
“Exportamos só 1 por cento. É uma gota. E ainda assim, está distribuída em 73 países. O que o pequeno tem que fazer é buscar nichos de mercado. Produto de valor agregado não é volume. É história, identidade, cultura.”
Falta de ação coordenada atrasa avanço internacional
O fundador da Expocachaça critica a falta de políticas integradas para promover a bebida no exterior.
“Tem 20 anos que os projetos da Apex para a cachaça são os mesmos. Participação em feira com estande pequenininho, gastando dinheiro sem retorno. Continuamos com o mesmo 1 por cento de exportação. Se faz sempre a mesma coisa, o resultado não muda.”
Para ele, o Brasil precisa seguir o exemplo do México com a tequila. “O que é necessário é mudar a forma de entrar no mercado externo. Trabalhar de forma organizada. Governo e iniciativa privada juntos. Hoje, cada estado tem sua associação, cada uma com foco nas políticas internas. Não existe uma pauta nacional comum.”
Cultura e transformação na Expocachaça
Desde sua criação em 1998, a Expocachaça se consolidou como vitrine de negócios, mas também como ferramenta de mudança cultural.
“No primeiro evento, tinha mulher que falava pro marido: você é um homem sério, não vai beber cachaça não. Quando elas entravam e viam que todos os estandes eram de família, com móveis da casa, fotografias, um clima de lar, isso mudou. O preconceito caiu porque viram que por trás da bebida existe cultura.”
O impacto vai além. “Tem empresa que começou numa garagem. Hoje exporta equipamentos para vodka, gin, rum, cerveja, whisky. Isso me deixa muito feliz. Criar uma vitrine onde o pequeno possa crescer.”
Novos produtos, novos públicos
Além da bebida, o evento incorporou ao longo dos anos a produção de cervejas especiais, doces, azeites, vinhos e licores.
“Em 2007, eu trouxe a cerveja pra dentro da Expocachaça. Teve gente que arrepiou. Mas eu falei: isso aqui é um evento de água e negócio. Os produtores de cerveja artesanal não tinham ponto de venda, nem visibilidade. Com a feira, ganharam espaço e autonomia.”
A mesma lógica se aplica à doçaria mineira e outros segmentos.
“Tenho azeites da Serra da Mantiqueira, vinícolas, produtores de jabuticaba, doces líquidos como licores. É uma riqueza enorme da cultura gastronômica de Minas. E a cachaça é o fio condutor.”
Desafios e oportunidades
Para José Lúcio, o maior desafio dos pequenos produtores é entender que marketing e distribuição são parte do negócio.
“Eles não gastam com mídia, não investem em marketing. Mas não adianta fazer uma propaganda linda se a pessoa não acha seu produto pra comprar. Promoção é o rei, mas distribuição é o reino.”
Ele defende que os produtores se unam. “O pequeno tem que trabalhar junto. Buscar recursos coletivamente. Criar campanhas de impacto. Se continuar cada um por si, será uma luta permanente.”
A expectativa para a edição deste ano é alta. Além das exposições, haverá rodadas de negócios, degustações, shows e atividades culturais.
“É uma oportunidade de mostrar o que é nosso. Nossa cultura, nossa produção, nosso sabor.”