A cadeia produtiva do leite em Minas Gerais atravessa um momento de forte tensão. O litro pago ao produtor caiu pelo segundo mês consecutivo, mesmo em plena entressafra – período em que o preço historicamente sobe. Segundo o Cepea, o valor médio pago em junho foi de R$ 2,73, queda de mais de 4% em relação ao mês anterior.
Para o diretor do Sindicato das Indústrias de Laticínios de Minas Gerais (Silemg), Eduardo Nascimento, a queda é reflexo de um desequilíbrio entre produção crescente e consumo estagnado. Ele explica que há nove trimestres seguidos de aumento de produção, com destaque para Minas Gerais, que cresceu 7,5% em 2023, enquanto o Brasil teve expansão entre 2% e 3%.
“Minas Gerais cresceu cerca de 1,2 milhão de litros de leite por dia no ano passado. É disparado o maior estado produtor”, afirmou em entrevista à 98 News nesta terça-feira (15/7).
Oferta interna e importação pressionam o mercado
Além da produção recorde, o setor enfrenta um volume crescente de importações de leite da Argentina e do Uruguai. Com isenção de tarifas no Mercosul, os países vizinhos ampliaram suas vendas para o Brasil. As importações, que antes giravam em torno de 100 milhões de litros por mês, hoje chegam a 200 milhões.
“Eles invadem o nosso mercado. Produzem mais do que consomem, com custo mais baixo e subsídios internos. É uma concorrência desleal”, diz Eduardo.
Estrutura precária e custo elevado
A logística da cadeia do leite no Brasil também encarece a produção. Segundo o diretor do Silemg, o custo de coleta do leite nas fazendas chega a 25 centavos por litro, enquanto países concorrentes operam com menos de 5 centavos.
“Temos estradas ruins, veículos pequenos para transporte de ração e problemas sérios com energia elétrica em várias regiões de Minas. Isso prejudica o resfriamento e até o processo de ordenha.”
O sindicato já levou essas demandas ao governo estadual, mas os avanços ainda são lentos. A oscilação da energia, por exemplo, tem levado ao descarte de grandes volumes de leite, afetando a rentabilidade do produtor e a qualidade do produto final.
Pequenos produtores estão saindo da atividade
A queda no preço e os altos custos têm levado muitos produtores a abandonar a atividade. O Brasil já teve mais de 1 milhão de produtores de leite; hoje são entre 300 e 400 mil.
“Isso já é uma realidade. Os 100 maiores produtores cresceram 15% no ano passado. O restante do país, entre 2% e 3%. Há uma concentração da produção em grandes fazendas.”
Embora o movimento não comprometa o abastecimento, Eduardo alerta para os impactos sociais.
“O leite é a renda fixa mensal de milhares de pequenos produtores. Abandonar a atividade afeta diretamente a economia das pequenas cidades.”
Expectativa para o segundo semestre
Com a chegada da safra, a expectativa é de ainda mais oferta. E o consumo, por sua vez, continua pressionado pelos juros altos, inflação e perda de poder de compra.
“O consumidor está com o bolso disputado. Não vejo a Selic cair tão cedo. A tendência é de queda gradual nos preços, tanto para o produtor quanto nas gôndolas.”
A previsão do Silemg é de um cenário difícil até o fim do ano. Apesar disso, Eduardo pondera que o consumidor pode ser beneficiado no curto prazo, com preços mais baixos no varejo.
“A lei da oferta e da procura ninguém derruba. O que nos resta é buscar competitividade, investir em escala e infraestrutura. Do contrário, a situação vai se repetir ano após ano.”