A infelicidade não cai do céu. Nem é só consequência de crises econômicas ou de salários achatados pela inflação. No Brasil, ela tem um nome mais profundo: insegurança institucional.
É fácil perceber quando um país pisa em ovos. As normas mudam ao sabor de decisões judiciais, o Congresso vota sem coerência de agenda, e a Presidência reage mais do que age. A cada semana, há um novo imbróglio fiscal, uma judicialização que paralisa investimentos, ou uma disputa de egos entre Poderes que paralisa o que deveria funcionar.
O Brasil e o índice de Felicidade Mundial
O brasileiro sente essa insegurança no bolso e na alma. E isso não é achismo: o Índice de Felicidade Mundial 2024 colocou o Brasil na 44ª posição, muito atrás de países com PIB per capita similar, mas com instituições estáveis. A pesquisa Gallup aponta que 56% dos brasileiros afirmam que vivem sob estresse diário, contra uma média global de 41%. E se o desemprego, a inflação e os serviços públicos precários são causas evidentes, a raiz está na falta de previsibilidade das regras do jogo.
O investidor não sabe se o imposto vai subir ou cair porque um decreto pode ser derrubado pelo Congresso ou ressuscitado pelo Supremo. O trabalhador não sabe se a aposentadoria será a mesma em dez anos, se a CLT resistirá à próxima PEC ou se seu emprego sumirá na próxima onda de insegurança econômica gerada por decisões de Brasília. O empreendedor médio, que paga 13 impostos federais e uma miríade de obrigações acessórias, vive sob o medo de interpretações divergentes entre Receita, CARF e Judiciário.
Essa insegurança institucional não é abstrata, ela gera custo de capital maior, menos empregos formais, salários estagnados e fuga de investimentos. O “custo Brasil” é, antes de tudo, um “custo institucional”. E esse custo se reflete em menos mobilidade social, menos consumo e menos perspectivas de futuro, alimentando o ciclo de infelicidade.
O Relatório de Governança do Banco Mundial (Worldwide Governance Indicators) mostra que o Brasil recuou em “Estabilidade Política” e “Efetividade Governamental” nos últimos cinco anos, mesmo em momentos de crescimento econômico pontual. Países que avançam na previsibilidade institucional, como Chile e Portugal, colhem redução de desigualdade e melhora nos índices de felicidade, porque regras claras permitem planejamento de vida e de negócios.
A felicidade, no fundo, é filha da confiança. E confiança depende de instituições sólidas e previsíveis, que dêem segurança ao cidadão de que amanhã não haverá uma canetada mudando tudo de novo. A cada tensão entre STF e Congresso, a cada instabilidade fiscal criada por disputas políticas, a cada reversão de regra tributária que afasta investimentos, o Brasil perde um pouco mais da serenidade necessária para crescer.
Em um país onde mais de 80% dos jovens querem ir embora, segundo pesquisa AtlasIntel, fica evidente que a infelicidade não se deve apenas à economia, mas ao medo do que pode acontecer amanhã. A democracia precisa funcionar, mas também precisa funcionar bem: garantir a previsibilidade e a estabilidade das regras, blindando o país de soluções improvisadas e de instabilidades institucionais que corrói o futuro.
Enquanto a insegurança institucional for a regra, a infelicidade coletiva será o sintoma. E nenhum programa social, PEC ou slogan conseguirá reverter isso de forma duradoura.
O Brasil precisa entender que o futuro começa quando a lei vale para todos, as regras não mudam ao sabor dos ventos, e os Poderes se respeitam em suas competências. Porque a felicidade de um povo não se constrói apenas com renda, mas com a paz de saber que amanhã não será um campo de incertezas permanentes.