Estudo psicossocial: a demora que destrói infâncias 

Siga no

Por falta de profissionais, estudos psicossociais estão sendo agendados para daqui um ano, deixando crianças afastadas dos pais e expostas a traumas. O prejuízo emocional pode ser irreversível (Foto: freepik.com)

Compartilhar matéria

Ele tem apenas cinco aninhos e convivia com o pai todos os dias. Assim como sua irmã, de apenas três anos. O caso é verídico, mas, se necessário for eu citar nomes, aqui serão fictícios para a preservação de suas identidades.

Certo é que não há ninguém mais prejudicado que essas crianças, dentro do processo de divórcio de seus pais. 

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

A mãe, traída, não superou a decepção e agora trava uma verdadeira batalha judicial que engrossa as fileiras do Poder Judiciário. Para se vingar do ex-marido traidor, usa seus dois filhos. Uma menina e um menino que são alucinados pelo pai. 

A separação de fato do casal (separação de fato é quando um deles sai de casa sem que ainda haja um processo judicial) foi no ano passado. Cinco meses depois, após enviar mensagens ao ex-marido, a mulher se diz ameaçada e aciona a polícia. Uma medida protetiva estava a caminho. E quando ele menos esperava, é preso. Mas pior que o cárcere que durou dois dias, foi a distância dos filhos, imposta pela ex-mulher, que a seu favor, agora tem a Maria da Penha. 

Ela não raciocina bem. Não enxerga que ao tentar ferir de morte o ex-marido, está na verdade, alienando seus filhos. Impedindo o convívio e tomando violentamente para si a posse da infância destas duas crianças.

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Este é apenas um, dos milhares de casos de dissolução familiar litigiosa que aguardam julgamento. E estas crianças terão que esperar, no mínimo, um ano para – quem sabe após o Estudo Psicossocial – voltar a poder ver o pai todos os dias. 

Em diversas comarcas de Minas Gerais, inclusive em algumas Varas de Família da capital, pais e filhos esperam por meses para a realização do estudo psicossocial, imprescindível para definição ou alteração de guarda, convivência e fixação de residência. 

Há casos em que esse procedimento fundamental está pautado para 2026. Enquanto isso, crianças seguem afastadas de seus pais e submetidas a contextos de conflito, sendo a corda do cabo de guerra entre adultos que não conseguem dialogar, e sem qualquer avaliação técnica que possa protegê-las de forma adequada.

E não há como ser diferente. 

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Conforme estatística divulgada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) no link TJ Em Números, quase 180 mil processos tramitam nas Varas de Família de MG. O que significa que são analisados por juízes que definirão os casos quando emitirem as sentenças. 

E destas sentenças, cabem recurso, que são julgados na 2ª Instância, pelos desembargadores que atuam nas 4ª e 8ª Câmaras Cíveis Especializadas (responsáveis, dentre outros, pelos recursos dos casos de família). 

E, ao consultar o site do TJMG, verifica-se que há 11.695 processos aguardando julgamento de seus recursos. 

https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/transparencia/tj-em-numeros/qlik/painel-tatico-do-estoque-processual-na-2-instancia.htm

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Imagine que cada processo conta a história de famílias dilaceradas e de crianças cujas infâncias são destruídas pela falta de maturidade de adultos. É falta de maturidade, porque se as pessoas tivessem a capacidade de dialogar e resolver seus conflitos com bom senso e sabedoria, não haveria a necessidade de movimentar o Poder Judiciário. 

Mas como diz aquele velho ditado: quando a cabeça não pensa… o corpo padece. E completo: quando os pais (e mães) não pensam, as crianças padecem. 

Mas voltando a um dos pontos mais nevrálgicos das Varas de Familia… afinal, o que é o estudo psicossocial?

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

É uma avaliação técnica conduzida por psicólogos e assistentes sociais do Poder Judiciário, prevista no art. 8º da Lei 12.318/2010, que trata da alienação parental, e também utilizada com base no art. 699 do Código de Processo Civil (CPC), para subsidiar decisões sobre guarda, convivência de acordo com o melhor interesse da criança. 

Essa avaliação investiga o contexto emocional, relacional e social da família, analisando aspectos como vínculos afetivos, práticas parentais, e possíveis indícios de abuso ou manipulação psicológica.

O estudo psicossocial é o mais importante instrumento técnico capaz de dar ao juiz uma visão real da dinâmica familiar. Sem ele, decisões acabam baseadas apenas em narrativas conflitantes. E quem mais sofre com essa omissão é a criança.

Enquanto o processo aguarda o estudo, muitos pais permanecem sem contato com seus filhos. O afastamento, nesses casos, não é apenas físico ou emocional — é também jurídico. A guarda, quando mal exercida, pode se transformar em posse violenta da infância, privando a criança do convívio saudável com ambos os pais, o que fere diretamente o princípio do melhor interesse da criança, previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O Judiciário precisa tratar essas ações com prioridade máxima, pois o vínculo entre pais e filhos não pode esperar um ano para ser reavaliado. Cada dia sem contato é um retrocesso afetivo que pode marcar essa criança por toda a vida.

A lentidão nos estudos psicossociais não é apenas uma falha administrativa — é uma violação de direitos. E a Justiça precisa agir antes que os danos se tornem permanentes.

Compartilhar matéria

Siga no

Camila Dias

Advogada especialista em Direito de Família - mediadora, conciliadora. Jornalista, especialista em Criminologia.

Webstories

Mais de Entretenimento

Mais de Colunistas

Estradas federais: o labirinto da incompetência

Oratória: ninguém começa pronto

De onde vem o dinheiro? Do latim ao bolso de hoje

Síndrome do excesso de possibilidades: por que escolher nunca foi tão difícil

Roupas usadas, negócio de bilhões: o boom da moda sustentável

Networking que vale ouro: por que qualidade supera quantidade

Últimas notícias

Emmy 2025: Owen Cooper, de ‘Adolescência’, bate recorde e faz discurso inspirador ao ganhar prêmio

Pesquisa revela alta no preço da gasolina e do etanol em BH

Neymar volta a criticar gramado sintético após jogo na Arena MRV

Semana será de tempo instável em Belo Horizonte; veja a previsão

Goleiro Everson denuncia importunação contra a filha, anuncia ‘vias legais’ e recebe apoio de Hulk e do Galo

Vitor Hugo entende críticas e pede “menos fala e mais trabalho” no Atlético

Cuello lamenta fase ruim do Atlético e explica: ‘falta confiança’

Leônidas de Oliveira deixa o cargo Secretário de Cultura e Turismo de Minas

‘Não me senti representado’: Jorge Sampaoli se incomoda com ‘falta de ambição’ do Atlético contra o Santos