O tabuleiro mineiro se move
Minas Gerais está mais viva do que nunca no xadrez político nacional. E, como toda boa partida, tem lances ousados, blefes calculados e algumas jogadas que ainda permanecem no sigilo das conversas reservadas. A mais barulhenta delas nos últimos dias atende pelo nome de Matheus Simões, atual vice-governador, que já tem destino partidário certo: o PSD de Gilberto Kassab. A filiação está definida e com data marcada, e embora Simões evite falar abertamente sobre o assunto, a decisão pavimenta um novo caminho na sucessão estadual.
Para Kassab, o movimento é um sonho antigo. Ter um candidato competitivo em Minas, com chances reais de vencer a disputa pelo governo. E Simões, com seu perfil técnico e proximidade com a atual gestão, surge como aposta sólida nesse projeto. A mudança, no entanto, produz efeitos colaterais imediatos: o PSD deixa de ser uma alternativa para Rodrigo Pacheco, atual presidente do Senado.
Pacheco entre a toga e o Palácio Tiradentes
A situação de Rodrigo Pacheco se torna mais complexa a cada movimento. Fora do PSD, o senador precisa agora de uma nova sigla para sustentar seu projeto político, seja ele a candidatura ao governo mineiro, seja a realização de um sonho antigo, tornar-se ministro do Supremo Tribunal Federal. No primeiro cenário, Pacheco carrega um trunfo valioso, o apoio explícito do presidente Lula, que vê no mineiro um aliado estratégico para fortalecer a presença petista no estado.
A prefeita de Contagem, Marília Campos, deixou claro em conversa recente que Pacheco é o nome preferido do PT para a disputa. Mas a travessia até lá não será simples. Uma das opções é o MDB, legenda de origem do senador. O problema? Newton Cardoso Júnior, presidente do partido em Minas, resiste à ideia e não demonstra entusiasmo em abrigá-lo. Há outras articulações em curso dentro do MDB, e a presença de Pacheco ainda é vista com cautela.
Sem espaço no MDB, outra possibilidade ganha força, o PSB de Geraldo Alckmin. O vice-presidente tem sinalizado, ainda que reservadamente, simpatia pela filiação de Pacheco à sigla. Uma movimentação nesse sentido poderia redesenhar o jogo eleitoral mineiro e fortalecer alianças no campo governista.
Cleitinho fora do jogo, por enquanto
Outro personagem importante do enredo mineiro é o senador Cleitinho Azevedo. O Republicanos, seu atual partido, já deixou claro, ele não será candidato ao governo estadual pela legenda. A decisão caiu mal e Cleitinho, acostumado com a retórica direta e a comunicação afiada nas redes sociais, ainda não digeriu bem a notícia.
Falta-lhe, porém, algo essencial para a construção de uma candidatura competitiva, articulação política. A habilidade de costurar apoios, negociar alianças e construir pontes ainda é uma lacuna evidente em sua trajetória.
A tentativa recente de se aproximar de Ratinho Júnior, governador do Paraná, oferecendo-se como vice em uma eventual candidatura presidencial, foi recebida com frieza tanto no PSD quanto no Republicanos. O episódio expôs a dificuldade de Cleitinho em jogar o jogo político no nível mais alto, algo que pesa contra ele em um estado complexo e decisivo como Minas Gerais.
Nicolas Ferreira e a carta do empresariado
No campo da direita, o nome de Nicolas Ferreira permanece cercado de mistério. Embora resista publicamente à ideia de disputar o governo, há uma movimentação silenciosa para montar uma chapa competitiva em torno do deputado federal. O plano inclui a escolha de um vice com perfil técnico e experiência em gestão, e o nome que circula com mais força é o de um líder empresarial de peso em Minas, ainda mantido em sigilo.
A estratégia é clara, combinar o potencial eleitoral massivo de Nicolas, impulsionado por sua popularidade digital, com a credibilidade administrativa de um nome do setor produtivo. Essa fórmula, se confirmada, pode colocar o bolsonarismo em posição relevante na disputa estadual e tornar o pleito ainda mais imprevisível.
Improviso fiscal: a crise que o Brasil ignora
Enquanto Minas traça suas linhas para 2026, Brasília segue representando um espetáculo à parte, e não no bom sentido. Um grupo de economistas de peso, que inclui Paulo Hartung, Persio Arida, Edmar Bacha, Armínio Fraga, Henrique Meirelles, Mailson da Nóbrega, Marcos Mendes e Elena Landau, soou o alarme. 80% das propostas apresentadas pelo Congresso Nacional e pelo governo federal não têm estimativa de despesa.
Isso mesmo: quatro em cada cinco projetos que circulam pelo Parlamento e pelo Planalto são aprovados sem que ninguém saiba quanto custam aos cofres públicos. O diagnóstico é devastador. Criam-se programas sociais, ampliam-se benefícios e concedem-se renúncias fiscais no escuro, sem base técnica ou responsabilidade orçamentária.
O resultado é um debate público teatral, onde promessas substituem planos e o orçamento se transforma em ficção. Sem saber o custo real de cada iniciativa, torna-se impossível definir prioridades, comparar alternativas ou responsabilizar autores por ideias inviáveis. E, como sempre, a conta chega, pesada e inevitável.
Se não houver correção de rumos na política fiscal do atual governo, os números e as projeções são assustadores. Num cenário já avaliado por economistas, até 2030, a dívida pública brasileira deve atingir 120% do PIB. É um cenário que ameaça a estabilidade fiscal, afasta investimentos e compromete o crescimento de longo prazo. E o mais grave, revela um governo que, mais do que gastar demais, gasta sem saber onde e por quê.
Entre a política e a matemática
O Brasil vive hoje um paradoxo cruel. Enquanto o país discute nomes e alianças para as próximas eleições, ignora os fundamentos que sustentam qualquer projeto político viável. Sem disciplina fiscal, sem responsabilidade no gasto público e sem transparência nas contas, nenhuma plataforma, de direita ou de esquerda, resistirá ao teste da realidade.
Minas Gerais, como palco central da política nacional, reflete esse dilema em escala local: candidaturas se desenham, partidos se reposicionam e projetos pessoais se entrelaçam com interesses partidários. Mas o pano de fundo, silencioso e incômodo, é o mesmo: um Estado que precisa reencontrar o equilíbrio entre ambição política e responsabilidade fiscal.
E enquanto esse equilíbrio não vier, continuaremos reféns de dois males que se alimentam mutuamente, a política feita no improviso e a economia conduzida às cegas.