Às 17h desta terça-feira, em Brasília, Alexandre Kalil assina sua filiação ao PDT. O ato, aparentemente burocrático, tem um peso político que vai muito além do papel, ele representa a largada simbólica para a disputa pelo governo de Minas em 2026. Kalil, que conquistou mais de 25% dos votos na eleição estadual passada, na verdade, mais de 35% no primeiro turno de 2022, emerge novamente no tabuleiro como um nome com densidade eleitoral, visibilidade e, sobretudo, ambição.
O ex-prefeito de Belo Horizonte não chega como estreante. Carrega a marca de quem comandou a capital mineira por um mandato e meio, de quem polarizou a disputa estadual contra Romeu Zema e de quem gosta de ser chamado de “outsider” mesmo estando dentro do jogo. A filiação ao PDT, legenda histórica, trabalhista, herdeira de Brizola e Jango, sinaliza que Kalil pretende vestir um figurino político mais estruturado, menos personalista e mais articulado com o campo de centro-esquerda. Mas esse figurino precisa servir, e, em política, a roupa nem sempre veste como o espelho promete.
Entre o capital eleitoral e o campo minado
Kalil começa a corrida com um trunfo que poucos têm: nome conhecido e voto testado. A eleição de 2022 mostrou que ele tem base e poder de fogo para ser competitivo. Pesquisas recentes colocam seu nome em segundo lugar nas intenções de voto, com cerca de 16%, atrás do senador Cleitinho Azevedo, que lidera com aproximadamente 28%, e à frente de Rodrigo Pacheco, que oscila em torno de 9%. Ou seja: Kalil está no jogo desde a largada.
Mas transformar esse potencial em vitória exige algo que vai além da popularidade. Ele precisa de estrutura partidária, tempo de TV e alianças robustas, ativos que não se constroem da noite para o dia. O PDT lhe dá legenda e palanque nacional, mas é insuficiente sozinho. Para chegar ao segundo turno e, eventualmente, ao governo, Kalil terá que costurar apoios com partidos médios e regionais.
O maior risco, no entanto, é ficar no meio do caminho. Se Cleitinho consolidar a direita e se Pacheco for o nome do lulismo em Minas, Kalil pode ser engolido pelo voto útil polarizado. Nesse cenário, mesmo com discurso forte e presença midiática, corre o risco de estacionar em torno dos 12% a 15% e ver a disputa seguir sem ele.
O primeiro movimento já é especulado nos bastidores: Duda Salabert, deputada federal do PDT e uma das vozes mais conhecidas da legenda em Minas, pode ser o nome ao Senado ou até candidata a vice na chapa. A dobradinha Kalil-Duda criaria um arco trabalhista-progressista com apelo urbano e identitário, reforçando a presença da sigla em Belo Horizonte e na Região Metropolitana.
Outra possibilidade é reedição de alianças com o PT, como em 2022, quando André Quintão foi seu vice. Apesar de Kalil ter dito que “não será o candidato da esquerda”, a aproximação com setores do PT pode ocorrer se o partido desistir de lançar um nome próprio para não fragmentar o campo progressista.
Há ainda o espaço do centro pragmático, que pode se aproximar caso vejam em Kalil um caminho para derrotar tanto a direita radical quanto a esquerda alinhada a Lula. São partidos que não votam por ideologia, mas por viabilidade. E se Kalil crescer nas pesquisas ao longo de 2025, essa viabilidade pode virar atração gravitacional.
A trajetória política de Kalil carrega virtudes e espinhos. É popular e direto, mas também polêmico e intempestivo. Essa autenticidade pode ser trunfo, mas também vulnerabilidade. Críticas à sua gestão em Belo Horizonte, ações judiciais pendentes e o rótulo de “independente demais” podem afastar parte da classe política tradicional, justamente a que ele precisa atrair.
Outro desafio será a narrativa. Kalil precisará ir além da persona do “gestor antipolítico” e apresentar um projeto de Minas: o que pensa sobre dívida estadual, infraestrutura, educação, segurança, mobilidade e desenvolvimento econômico. Não basta ser “contra Zema” ou “contra Bolsonaro”, será necessário dizer o que se é a favor.
A entrada de Kalil reorganiza peças no xadrez mineiro. De um lado, a direita terá que decidir-se entre Nikolas, Cleitinho e Simões como candidatos competitivos, herdeiros naturais do zemísmo e do bolsonarismo. De outro, Rodrigo Pacheco pode ser o nome do lulismo e do centrão governista. Kalil tenta ocupar o meio do tabuleiro, espaço que historicamente pode ser pequeno, mas, quando bem explorado, pode ser decisivo.
A grande questão é: conseguirá o ex-prefeito transformar sua popularidade em estrutura? Construirá alianças amplas ou ficará isolado em torno do PDT? E, sobretudo, apresentará ao eleitor mineiro um projeto de futuro, ou ficará preso ao personagem do passado?
Kalil sabe que em Minas se vence eleição não com fogos de artifício, mas com paciência de ourives, com alianças costuradas fio a fio, com discurso que toca a alma e estrutura que chega ao último grotão do Jequitinhonha. Hoje, ao assinar sua ficha no PDT, ele entra no jogo. O desfecho, porém, dependerá da resposta a uma pergunta que ecoará até outubro de 2026:
Alexandre Kalil será o protagonista de uma nova história mineira, ou apenas mais um personagem no enredo da política estadual?