No Visão Macro de hoje, vamos discutir o novo modelo de crédito imobiliário proposto pelo governo federal, em conjunto com o Banco Central, que participa do processo de análise.
Mais do que avaliar se a medida é positiva ou negativa em seu desenho microeconômico que, aliás, é mais positivo do que aparenta, vamos focar nos efeitos secundários. Trata-se claramente de uma medida parafiscal, que amplia a capacidade de absorção de crédito na economia e, de certa forma, dificulta o processo de convergência inflacionária ao longo do tempo. Isso é bastante relevante no contexto de queda de juros e merece atenção.
No fim das contas, deveríamos estar discutindo como ampliar a capacidade de poupança da população, e não apenas a de endividamento. O grande problema do crédito imobiliário hoje é que a população não tem conseguido poupar. Pelo contrário, o nível de comprometimento de renda é elevado, como já observamos em outras análises, inclusive com aumento expressivo da inadimplência. Esses dados são fundamentais para entender os riscos de assumir novas dívidas.
Por outro lado, a medida também pode ter efeitos eleitorais, funcionando como uma continuidade de iniciativas já aprovadas, mas que ainda aguardam votação final no Senado, como a isenção de até R$ 5.000. Nesse contexto, discute-se menos a capacidade de poupança e mais a capacidade de gasto de uma população com alta propensão marginal a consumir, ou seja, cada real que sobra é gasto, e não poupado.
E aqui está o cerne do problema: não há estímulo concreto à poupança nem ao investimento de longo prazo. A qualidade do crescimento econômico brasileiro tem se apoiado em estímulos fiscais de curto prazo, tendência que se mantém há pelo menos cinco anos. E isso independe de qual partido ocupa o Palácio do Planalto, ambos os lados têm priorizado o consumo e negligenciado a formação de poupança. Esse é o grande gatilho que poderia, de fato, mudar o patamar econômico do país.
Com relação ao crédito imobiliário, há outro ponto importante: a ampliação do teto de R$ 1,5 milhão para R$ 2,5 milhões nos financiamentos subsidiados. Essa mudança distorce o nível de juros e tende a pressionar o preço dos imóveis, o que, por consequência, encarece os aluguéis. O Brasil tem visto crescer o número de pessoas que alugam, em vez de comprar imóveis, o que também reflete uma mudança geracional relevante.
Portanto, mais do que discutir se a medida é “positiva” ou “negativa”, é preciso analisar os efeitos secundários e terciários. Diante do atual nível de endividamento público e privado, novas medidas parafiscais não parecem o melhor caminho para estimular o crescimento. Pelo contrário, o país dificilmente avançará enquanto não discutir a capacidade de poupança interna e continuar apenas incentivando o endividamento de uma população já altamente comprometida financeiramente.