Hoje vamos falar sobre a mobilidade elétrica, mas no transporte coletivo. Ele não é apenas um veículo para ir e vir: é o meio mais sustentável para acessar necessidades cotidianas como trabalho, educação, saúde e lazer, sendo um elemento essencial para a qualidade de vida e também para a qualidade das nossas cidades.
O setor de transporte é o maior emissor de gases de efeito estufa nas áreas urbanas, e as cidades brasileiras concentram grande parte dessas emissões. Por isso, a transição para uma frota de ônibus elétricos é uma oportunidade concreta de mudar esse cenário.
Segundo o estudo Acelerando a Transição, para eletrificar a frota brasileira de ônibus até 2030, quase 74% dos veículos cadastrados nas 21 principais regiões metropolitanas têm mais de 5 anos de uso. Isso significa que milhares de ônibus poderiam ser substituídos de imediato por veículos mais eficientes e até mesmo elétricos. Do total, 14.146 ônibus poderiam ser renovados imediatamente, pois rodam menos de 200 km por dia e já possuem idade superior a 5 anos.
Só essa renovação parcial já permitiria cortar uma parte significativa das emissões de gases de efeito estufa, além de reduzir o ruído, melhorar a qualidade do ar e trazer outros benefícios para as cidades. Isso mostra que a transição não depende de grandes investimentos futuros, mas pode começar agora, de forma gradual e inteligente.
Mas é fundamental compreender: valorizar o transporte coletivo não é apenas trocar o motor a diesel por um motor elétrico. É preciso olhar a mobilidade de forma integrada. De nada adianta eletrificar ônibus se eles continuarem presos em congestionamentos ou se os sistemas não se articularem entre si.
Um exemplo claro é a própria Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde os desafios são evidentes: ainda não há tarifa integrada entre sistemas municipal e metropolitano, o usuário paga duas vezes, as linhas não se conectam de forma eficiente e existem apenas dois corredores BRT Move que somam menos de 25 km, além de cerca de 40 km de faixas exclusivas — muito pouco para uma metrópole com mais de 5 milhões de habitantes.
Essa fragmentação reduz bastante a eficiência do transporte público e empurra cada vez mais pessoas para carros e motos. Outro ponto importante é o subsídio tarifário. Nas principais cidades do mundo, o transporte coletivo só é sustentável porque recebe subsídios — seja para manter tarifas acessíveis, seja para garantir qualidade no serviço. Paris, Londres, Santiago e Madrid são exemplos de onde o custo não recai apenas sobre o passageiro.
No Brasil, porém, o peso do financiamento ainda está muito concentrado nos usuários e, em alguns casos, nos municípios, que têm orçamentos limitados. É urgente que Estados e União assumam também essa responsabilidade, garantindo previsibilidade financeira e criando condições para melhorar a mobilidade urbana por meio do transporte coletivo.
A contradição é que, ao mesmo tempo em que a Política Nacional de Mobilidade Urbana defende a prioridade do transporte público, o governo segue subsidiando a compra de veículos particulares. Isso significa mais carros, mais poluição, mais ruído e, claro, mais congestionamentos.
Se quisermos cidades mais sustentáveis e justas, precisamos inverter essa lógica. Apostar em ônibus elétricos é parte da solução, mas só terá impacto real se vier acompanhado de um sistema tarifário robusto, de integração metropolitana, de prioridade clara ao transporte coletivo e de uma articulação entre mobilidade, planejamento urbano e uso do solo.