A Casa Branca anunciou que vai aliviar tarifas sobre café, carne bovina e frutas. Para alguns, isso soa como se os Estados Unidos finalmente tivessem estendido um tapete vermelho para o agronegócio brasileiro. Para quem vive da terra, especialmente em Minas, onde café é quase religião, a notícia cai como aquele primeiro gole quente numa manhã fria. Mas a gente sabe. Café bom não se faz só com entusiasmo. É preciso olhar esse anúncio com uma xícara de realismo na mão.
Primeiro, o contexto: meses atrás, os EUA meteram uma tarifa de 10% sobre uma série de produtos e depois colocaram uma “super-sobretaxa” que podia chegar a 40% sobre exportações brasileiras. O impacto foi grande. Agora, vêm dizendo que alguns produtos “qualificados” estarão livres dessas tarifas. Mas, até agora ninguém explicou direito. É a tarifa-base que cai ou também a sobretaxa? Esse tipo de anúncio pode estar bonito no título, mas, cheio de neblina no rodapé.
Ainda assim, objetivamente falando, é um passo positivo. Para Minas, pode significar mais competitividade, mais espaço no mercado americano e, quem sabe, uma recuperação parcial de margens que já estavam sufocadas. Mas não é hora de estourar champanhe. A redução tarifária ajuda, claro. Só que ela não resolve logística cara, estrada esburacada, porto travado, custo de armazenagem, burocracia e todas as outras pedras que o Brasil joga no próprio sapato. Tarifa menor não conserta o caos do lado de cá.
Além disso, o mercado americano é uma fera que nunca dorme. Mesmo sem tarifas, o Brasil compete com Colômbia, Vietnã, México, Austrália e companhia. Os grandes compradores americanos querem preço, sim, mas querem também rastreabilidade, boas práticas ambientais, garantia de qualidade, regularidade na entrega. Se o produtor brasileiro não estiver afinado com essa pauta, tarifa zero vira vantagem desperdiçada.
Outro ponto importante: esse gesto dos EUA parece muito mais pragmatismo do que carinho. Com inflação de alimentos pegando por lá, reduzir tarifas sobre itens tropicais é tão romântico quanto uma planilha de Excel. Resolve o problema deles, e só indiretamente o nosso. Por isso mesmo, o Brasil precisa aproveitar a janela de oportunidade com inteligência, reforçar acordos sanitários, fortalecer certificações, investir em produto de maior valor agregado e colocar o café especial, as carnes premium e as frutas brasileiras no lugar onde realmente brilham.
O anúncio americano é uma boa notícia, mas não é redenção. Não vamos pular etapas, o jogo internacional continua duro, competitivo e cheio de nuances. O alívio tarifário é um vento a favor, mas, se o barco estiver com os remos quebrados, não adianta muito.
É hora de aproveitar o momento, sim, mas com os pés no chão. E talvez com um pão de queijo na mão, porque em Minas sabemos: notícia boa a gente celebra, mas sem perder o juízo.
