A ofensiva recente entre Israel e Irã tem desdobramentos que ultrapassam o campo de batalha. O confronto, embora apresentado como uma retaliação bilateral, toca questões profundas nas esferas doméstica, regional e geopolítica — e pode moldar o cenário internacional nos próximos meses. O professor Wilson Mendonça, da Skema Business School, analisou os desdobramentos do conflito nesta terça (17/6).
Pressão interna em Israel e no Irã
No campo interno, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu ganha força após anos de desgaste político e críticas ligadas a escândalos judiciais. Segundo a análise de Wilson, o apoio popular a Netanyahu já chega a cerca de 70%. Isso se deve, em parte, à narrativa de que Israel está agindo para impedir que o Irã desenvolva um arsenal nuclear — o que justificaria os chamados ataques “cirúrgicos”.
Do lado iraniano, o país também enfrenta uma forte pressão social. Com a economia em decadência e um regime teocrático sob tensão, o governo se fortalece ao adotar o discurso de soberania nacional e legítima defesa. Nesse cenário, o ataque israelense é interpretado como uma agressão externa e a retaliação, como um direito do Estado.
Escalada pode fragilizar lideranças
Se, a curto prazo, ambos os líderes colhem ganhos internos, o prolongamento do conflito pode ter o efeito oposto. Com o tempo, a população dos dois países pode questionar os custos — econômicos, sociais e humanos — da escalada militar. “O problema é quando isso vai ampliar para um período maior, o que pode fazer com que esses dois âmbitos percam sua força doméstica”, explica o consultor.
Risco de transbordamento regional
Na esfera regional, o conflito pode provocar reações em países como Iêmen, Líbano e outros vizinhos, que por ora se mantêm diplomaticamente à distância. Mas a instabilidade generalizada no Oriente Médio tende a pressionar alianças, ativar milícias e acirrar disputas já latentes.
“Essas questões regionais podem se transbordar para outras regiões, como o Iêmen, Líbano e outros Estados que nesse momento se mantêm ali, pelo menos diplomaticamente distantes”, diz Wilson Mendonça.
Petróleo, guerra cibernética e posicionamentos globais
A repercussão internacional do conflito Israel/Irã já afeta setores estratégicos como energia e logística. O preço do petróleo está sob pressão, e os seguros internacionais — especialmente no transporte — começam a ser comprometidos. Rússia e China acompanham os movimentos com atenção.
“A Rússia enxerga nisso como uma oportunidade de acelerar o seu processo de ataques à Ucrânia e reduzir essa urgência do seu cessar-fogo”, avalia Wilson. “A China também extremamente receosa contra o fornecimento de petróleo, mas mantém o diálogo com os dois.”
Enquanto isso, os países do G7 tentam alinhar discursos para evitar a escalada do conflito. França e Alemanha mantêm posição mais contida, enquanto os Estados Unidos demonstram apoio explícito a Israel, com movimentação da frota naval americana na região.
“Podemos dizer que, com base no G7, há sim uma certa concertação do Ocidente em relação a uma oposição, de evitar uma escalada do conflito”, explica Wilson Mendonça.
O que está em jogo
O futuro do conflito depende de como essas três esferas — doméstica, regional e geopolítica — vão responder ao agravamento da tensão. A duração dos combates, a reação das lideranças e os impactos econômicos serão determinantes para os próximos passos do Oriente Médio — e do mundo.