Eu sou Flávia Ivo, jornalista, e há mais de dez anos também sou paciente bariátrica. Fiz a cirurgia em 2013. Naquele momento, eu buscava mais do que uma mudança física: eu precisava recuperar minha saúde. A cirurgia me trouxe benefícios importantes, mas também revelou que a obesidade é uma doença crônica, que não desaparece com um bisturi.
Depois da operação, vieram outras etapas: cirurgias complementares, períodos de emagrecimento expressivo, mas também fases de reganho de peso. A vida seguiu com altos e baixos, como acontece com qualquer pessoa, e eventos marcantes mexeram diretamente com a minha relação com o corpo e com a comida.
Eu aprendi, nesse processo, que a bariátrica não é milagre. E o cirurgião e secretário da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, René Berindoague, reforça esse ponto. “O procedimento não é nenhum milagre ou fórmula mágica para emagrecer. É um tratamento médico indicado para pessoas que sofrem de obesidade, uma doença crônica que compromete tanto a saúde física quanto mental.”

Adaptação de rotina
Segundo René Berindoague, a cirurgia é uma ferramenta poderosa, mas que precisa andar junto com mudanças de estilo de vida. O paciente deve se adaptar a uma nova maneira de comer, praticar atividades físicas e manter acompanhamento nutricional. Além disso, não é um procedimento feito por estética: salva vidas e reduz o risco de doenças graves como diabetes tipo 2, hipertensão, apneia do sono, problemas cardíacos, ortopédicos e até câncer.
O cirurgião geral e diretor da Clínica Cronos, Mauro Jácome, que há 27 anos atua na área, complementa: “Um dos principais mitos é acreditar que a cirurgia resolve o problema completamente. A obesidade é multifatorial. Se a pessoa não se cuidar, pode voltar a engordar.”
Ele explica que, quando o paciente segue as orientações médicas, os benefícios são expressivos: maior expectativa de vida, melhora do sono, da respiração e até remissão de doenças como hipertensão e diabetes tipo 2.

Suporte contínuo
Na prática, pacientes confirmam essas transformações. “Você tem que estar com a cabeça muito bem resolvida, firme nesse propósito, porque a cirurgia não é um milagre. Ela é uma ferramenta maravilhosa”, ressalta a importância do preparo psicológico a empreendedora Daniela Turrer, de 44 anos, operada em 2012.
Ela conta que a redução do estômago tira a sensação de fome intensa, mas o resultado só se mantém com acompanhamento nutricional e atividade física. Daniela afirma que faria tudo de novo! “A vida ficou muito melhor, mais leve e feliz. Me sinto realizada, usando as roupas que eu queria. Quando a gente é feliz com a gente, é feliz para os outros também.”
A nutricionista Juliana Papini observa que o suporte precisa ser contínuo: “Depois da fase inicial da cirurgia, quando o paciente já perdeu peso e está motivado, é comum achar que vai dar conta sozinho. Mas não. O acompanhamento nutricional é para sempre.”
Ela explica que apenas o acompanhamento regular garante ingestão correta de proteínas, vitaminas e minerais, prevenindo deficiências e perda de massa magra.

Reganho de peso
Mas nem sempre o caminho é linear. A farmacêutica Cláudia Leite, de 55 anos, que fez a cirurgia em 2006, viveu momentos de reganho de peso relacionados a crises emocionais. “O desequilíbrio emocional, seja de qual origem for, afeta muitíssimo no reganho de peso”, conta.
Após uma síndrome de burnout, Cláudia recuperou 15 quilos. Voltou a engordar durante a pandemia, mas conseguiu reduzir parte com medicamentos e exercícios. Ela faz questão de reforçar: “A cirurgia não é e nunca foi a cura da obesidade.”
Para a psicóloga e mestre em Educação em Diabetes, Paula Lamego, é preciso compreender que a mudança vai além do bisturi. “A relação da pessoa com a comida não vai mudar só porque ela fez a bariátrica”, destaca.
Segundo ela, o paciente precisa de acompanhamento psicológico para aprender a regular emoções e desenvolver uma relação mais equilibrada com a alimentação ao longo da vida.