Belo Horizonte e o atraso sobre rodas

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Kaiporas / Divulgação

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A imagem de uma carroça puxada por cavalos, circulando no coração de uma capital com mais de 2,5 milhões de habitantes, é um retrato do Brasil que insiste em não sair do século XIX. Belo Horizonte ainda discute, em pleno 2025, se é justo ou não acabar com a tração animal. A resposta deveria ser óbvia: não há lugar para esse tipo de transporte em uma cidade que sonha com modernidade, dignidade e bem-estar.

Carroças representam um triplo atraso: social, ambiental e humano. 

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Social, porque expõem trabalhadores pobres a condições degradantes, colocando sobre eles, e não sobre o poder público, a responsabilidade por um modelo arcaico de mobilidade e sustento. 

Ambiental, porque sobrecarregam os animais em trajetos urbanos intensos, em meio a poluição e asfalto, gerando sofrimento e maus-tratos, ainda que involuntários. 

Humano, porque cristalizam a exclusão: o carroceiro permanece à margem, condenado a um ofício sem futuro, sem perspectiva de evolução tecnológica ou profissional.

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É claro que existe aqui um componente de subsistência. Muitas famílias vivem desse trabalho. Mas justamente por isso a manutenção da carroça não é solução, é condenação..

A lei e os dilemas

A legislação que proíbe a tração animal a partir de janeiro de 2026 é um passo civilizatório. O problema não é a lei, mas a falta de transição justa. O poder público tem a obrigação de oferecer alternativas reais, e não apenas promessas. Não basta recolher animais ou aplicar multas: é preciso criar políticas de requalificação, garantir renda temporária e incluir os carroceiros em programas de apoio social e de capacitação.

Existem porém alternativas que devem ser exaustivamente estudadas. A Substituição por veículos utilitários leves: pequenos caminhões ou motos elétricas subsidiados poderiam cumprir a mesma função de transporte de resíduos e materiais, sem crueldade animal e com ganhos de eficiência. A criação de Cooperativas de reciclagem: integrar os carroceiros a estruturas já existentes, como cooperativas de catadores, dando acesso a galpões, triagem de resíduos e remuneração justa.

A capacitação profissional: programas de treinamento em áreas de logística, manutenção automotiva ou serviços urbanos, aproveitando a experiência de quem já conhece a cidade e sua rotina de transporte. E incentivos fiscais e linhas de crédito. A PBH poderia criar mecanismos de financiamento para a aquisição de veículos, com carência e juros subsidiados, permitindo uma transição menos traumática.

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Não se trata de ignorar a realidade dura de centenas de famílias. O carroceiro não pode ser tratado como culpado, mas também não pode permanecer prisioneiro de um modelo indigno. A cidade precisa oferecer portas de saída. Modernizar, sim; excluir, jamais.

BH deve decidir se quer ser uma metrópole do futuro ou continuar presa ao espetáculo triste de cavalos exaustos em meio ao trânsito caótico. É uma escolha entre civilização e atraso, entre compaixão e indiferença. A carroça, símbolo de um Brasil já ultrapassado, não pode continuar ditando o ritmo da capital mineira.

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Paulo Leite

Sociólogo e jornalista. Colunista dos programas Central 98 e 98 Talks. Apresentador do programa Café com Leite.

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