O Brasil que não nasce

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IMAGEM ILUSTRATIVA (Edu Kapss/SMS Rio)

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Imagine um país que encolhe antes mesmo de envelhecer. Um país que, sem guerras, vai desaparecendo devagarinho, berço por berço. O Brasil de 2025 é um gigante demográfico que começa a se curvar diante da matemática cruel da natalidade em queda.

As estatísticas do Registro Civil apontam para a diminuição dos nascimentos. De acordo com os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2023 o país registrou 2,52 milhões de nascimentos, o Instituto ainda não consolidou os números de 2024, mas estima que de janeiro a novembro de 2024, nasceram aproximadamente 2,177 milhões de bebês no Brasil. São dados consolidados a partir do cruzamento das informações enviadas pelos cartórios em todo o país.

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O IBGE projeta que a taxa de fecundidade brasileira já está abaixo de 1,7 filho por mulher, bem distante dos 2,1 necessários para a reposição populacional. A pergunta que se impõe não é mais se isso afeta a economia, mas como e até quando vamos ignorar o impacto desse declínio silencioso.

Uma nova visão da realidade

Essa transição demográfica, tão celebrada nos anos 2000 como janela de oportunidade, agora ameaça virar armadilha. O bônus demográfico está se encerrando, e com ele, o fôlego da economia. Com menos jovens entrando no mercado de trabalho, a base da pirâmide previdenciária se estreita perigosamente, enquanto o topo, envelhecido, depende de uma arrecadação que minguará. O rombo virá, mais cedo do que tarde.

Mas o alerta mais recente, e talvez o mais inquietante,é o da criatividade em extinção. Isso é o que aponta o economista Pedro Fernando Nery, em sua coluna do último dia 19, no Estadão. Ele de maneira propositada reflete que menos nascimentos significam menos cérebros em ebulição, menos chances estatísticas de surgir um novo Santos Dumont, um Oscar Niemeyer, uma Mayana Zatz. A inovação, esse motor invisível do crescimento econômico, pode estar perdendo combustível no berço.

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Países como Hungria, Coreia do Sul e China já se deram conta do problema e lançaram mão de políticas ousadas: bônus em dinheiro, licenças estendidas, creches públicas em tempo integral, incentivos fiscais para mães jovens. A Hungria, por exemplo, oferece isenção total de imposto de renda para mulheres com três filhos ou mais. Na França, que mantém uma das maiores taxas de natalidade da Europa, o Estado investe quase 4% do PIB em políticas de apoio à família. E o Brasil?

Por aqui o diagnóstico é tímido e as ações praticamente inexistentes. Estudos do Banco Central apontam que a maior barreira à decisão de ter filhos no Brasil é a insegurança habitacional. Jovens adiam a decisão de ter filhos porque não têm onde criá-los com dignidade. Mas onde está a propalada política pública de habitação familiar? Cadê a articulação entre planejamento urbano, desenvolvimento social e crescimento populacional?

Num país onde metade das crianças vive na pobreza, a queda da natalidade não é apenas um fenômeno cultural. É uma resposta racional à falta de perspectiva. O Estado não deve impor políticas de estímulo aos nascimentos, deve garantir que gerar e criar uma criança não seja um ato de heroísmo, mas uma escolha possível, digna e segura.

A questão não é se o governo deve intervir, ele já está envolvido ao se omitir. Num Brasil que sonha com crescimento sustentado, a equação demográfica virou urgência de política econômica.

Ou agimos agora, ou veremos um país que envelhece em silêncio, mais pobre, mais solitário e, pior, sem herdeiros nem futuro.

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Paulo Leite

Sociólogo e jornalista. Colunista dos programas Central 98 e 98 Talks. Apresentador do programa Café com Leite.

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