Decisão sobre uso de câmeras por policiais militares não pode ser unilateral

Por

Paulo Leite

Siga no

Câmeras corporais em policial (Foto: Cristiano Machado/Imprensa MG)

A Justiça avalia um pedido feito pela promotora Maria Fernanda Araújo Pinheiro Fonseca, do Ministério Público de Minas Gerais, em que exige o uso imediato de câmeras corporais nos uniformes dos policiais militares no estado.

Ela argumenta que o governo de Minas pratica omissão por não disponibilizar informações sobre o uso das câmeras.

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Segundo ela, o governo mineiro — e aí fui pesquisar, e é isso mesmo — adquiriu 1.600 equipamentos em 2021. Desses, 1.040 foram financiados pelo Tesouro Nacional e 602 com recursos do fundo do Ministério Público. A promotora alega que a falta de transparência e a demora na implementação são injustificadas e indicam mau uso dos recursos.

Então, vamos atrás de dados e opiniões, porque essa é a nossa função, nosso ofício.

Os dados disponíveis, que reforçam a posição dos favoráveis ao uso das câmeras, mostram que o uso desses equipamentos pelos policiais militares da Bahia — estado conhecido pela violência policial — resultou em uma queda de 47% nas mortes por intervenção policial. São dados oficiais do governo da Bahia.

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Dados coletados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, também favoráveis aos que defendem o uso das câmeras, mostram queda de 27% nas mortes em ações policiais em outros estados que implementaram o equipamento.

Isso não pode ser entendido como a revelação de um maior número de maus profissionais nas polícias militares. Sabemos que toda corporação, todo segmento profissional, tem um setor contaminado por práticas não condizentes com o exercício de suas funções. Jornalistas, médicos, advogados, engenheiros: qualquer profissão tem maus profissionais.

Erros de cálculo por engenheiros, erros médicos por médicos, notícias que não são bem apuradas por jornalistas são uma realidade. Claro que tais números não podem e nem devem ser subestimados. Se há uma verificação positiva da diminuição da má conduta profissional de policiais, há que se tomar medidas punitivas e compreender melhor o uso das câmeras corporais.

Acontece que existem especialistas que têm opinião contrária ao uso dos equipamentos. Ontem, conversei com um oficial de alta patente da Polícia Militar de Minas Gerais, na tentativa de entender melhor o uso das câmeras corporais. Algumas ponderações feitas por ele merecem destaque.

Primeiro, o direito à privacidade. A utilização das câmeras corporais coloca em risco a privacidade tanto do policial quanto do cidadão. Existem situações sensíveis: violência doméstica e abuso são realidades em que se expõem imagens, e nem sempre há segurança sobre como serão tratadas. Esse oficial argumentou que o uso das câmeras pode interferir na maneira como as funções diárias da corporação são realizadas.

Tentei entender melhor essa questão.

Então veio o exemplo: “Um policial faz uma abordagem. Aquele que está sendo abordado — e hoje em dia vê-se muita imagem sendo gerada dessa forma — recebe uma ordem e, ao descobrir que está sendo filmado, reage para gerar conflito, para ‘lacrar’ em cima do policial e reverter a situação.”

Convenhamos, nos dias de hoje essas situações são comuns e rendem muitos “views” nas redes sociais.

Um policial tem uma estrutura de pensamento própria da realidade de sua atividade, e isso provoca reações diferentes; isso faz parte de sua formação profissional. Uma abordagem policial quase sempre acontece em situação de conflito ou, no mínimo, adversa, oferecendo àquele que está sendo abordado a oportunidade de se aproveitar do momento e mudar a dinâmica da operação — transformando-se em vítima.

Também há o problema do uso indevido dessas imagens. Por exemplo, se a gravação de uma câmera corporal vaza — e sabemos que imagens são vazadas o tempo inteiro — e cai nas mãos de um profissional irresponsável, um jornalista inescrupuloso que transforma a realidade com montagens sensacionalistas, possíveis pela tecnologia, teríamos danos irreversíveis tanto para os policiais quanto para os cidadãos.

Então, é um tema muito sensível, difícil de se chegar a uma conclusão utilizando-se somente de posições ideológicas e morais. Infelizmente, o que se observa é que esse debate vem sendo conduzido menos por questões técnicas e mais por impressões pessoais.

Particularmente, vejo um aspecto positivo, que é a segurança do policial quando a abordagem é feita sem intercorrências, sem que haja nenhuma alteração. Porém, não se pode ignorar que existam aqueles que se aproveitam da situação para reverter a realidade e ganhar seus minutos de fama — mesmo que de maneira inversa.

Creio que a determinação da promotora, baseada apenas na compra do equipamento, não se sustenta. Esses equipamentos foram adquiridos em convênios feitos com as secretarias de Segurança Pública dos estados.

O equipamento está sendo avaliado, e seu uso deve ser objeto de uma discussão. Se não há certeza, vamos envolver mais atores nessa decisão, que não pode ser tomada unilateralmente por uma promotora.

Siga no

Paulo Leite

Sociólogo e jornalista. Colunista dos programas Central 98 e 98 Talks. Apresentador do programa Café com Leite.

Webstories

Webstories

Mais de Entretenimento

Mais de Colunistas

Golpe nos aposentados: como identificar e recuperar o que é seu

A eterna árvore de Natal de BH

Um governo acuado pelas fraudes no INSS

Confira as primeiras imagens e informação do novo Fiat Pulse, que já é fabricado em segredo em Betim

Créditos de IPI para produtos imunes: decisão do STJ pode beneficiar a indústria nacional

A bomba-relógio da Previdência está prestes a explodir

Últimas notícias

Copa do Brasil: Cruzeiro defende vantagem contra o Vila; veja onde assistir

ALMG começa debater projetos de adesão ao Propag na próxima semana

Bolsas fecham em forte queda e dólar recua em meio a temor fiscal nos EUA

(NÃO PUBLICAR) Produção de aço bruto cai em Minas Gerais pela 2ª vez seguida em 2025

Concorra a ingressos: 22ª Festa Junina do Rotary Club Barro Preto

Juliano Lopes explica medidas para melhorar a mobilidade urbana em BH

Tottenham é campeão da Europa League após 17 anos sem títulos!

Fernanda Altoé: ‘O que lota o nosso plenário é decidir quem vai usar qual banheiro’

Secretário americano admite ‘grande possibilidade’ de sanções contra Moraes