Enquanto Belo Horizonte dá um passo à frente com a aprovação do decreto municipal da Liberdade Econômica, que traz desburocratização dos processos, dispensa alvarás para atividades de baixo risco e oferece segurança jurídica a quem quer trabalhar, na contramão o Brasil, em seu conjunto, parece retroceder duas casas ao insistir no aumento da carga tributária e na complexidade fiscal.
O decreto de BH segue a esteira da Lei de Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019), sancionada ainda no governo Bolsonaro, e é uma medida que vai além da retórica. Tira do papel o direito de empreender sem medo, sem esmola e sem labirinto cartorial.
Food trucks, salões de beleza, pequenas fábricas, marcenarias, manicures, prestadores de serviço… todos esses negócios, que vivem da agilidade, da criatividade e da coragem, agora têm um pouco mais de ar para respirar na capital mineira.
Mas não há fôlego que resista a um sistema tributário que morde mais do que devolve. A carga tributária bruta no Brasil aproxima-se dos 40% do PIB, segundo dados da Receita Federal. São quase 4 trilhões retirados da sociedade, e uma boa parte disso vem de tributos indiretos, que pesam mais sobre os mais pobres e sobre os pequenos negócios.
O empreendedor brasileiro, além de gerar emprego, precisa ser especialista em contabilidade, tributarista nas horas vagas e jogador de xadrez quando se trata de planejamento fiscal.
Essa contradição entre o que se faz localmente e o que se impõe nacionalmente revela um paradoxo cruel: a liberdade econômica é decretada, mas a escravidão fiscal é praticada.
A mentira da economia populista
O governo federal, enquanto sinaliza apoio à iniciativa privada com discursos moderados, ao mesmo tempo revoga benefícios fiscais, endurece as regras de compensação tributária, amplia a vigilância eletrônica e discute, nos bastidores, a criação de novos tributos setoriais disfarçados de “ajustes” ou “reestruturações”.
Recentemente, a medida provisória que deve substituir o aumento do IOF mira diretamente em empresas que utilizam compensações tributárias, um mecanismo legítimo e legal, mas tratado agora com desconfiança automática.
O ambiente de negócios no Brasil é dos piores entre as economias mundiais: insegurança jurídica e institucional, uma burocracia assustadora, um custo surreal e uma previsibilidade que é pura ficção.
E, mesmo com a promessa da reforma tributária, o que se vê no horizonte é um rearranjo que ainda mantém o cipoal tributário que enreda quem quer empreender — agora bem embalado, com novos nomes e novas siglas: CBS, IBS e o temido comitê gestor.
Belo Horizonte merece aplausos por tentar, dentro de suas competências, aliviar o peso que o empreendedor carrega. Mas sejamos francos: nenhuma cidade conseguirá ser, sozinha, o oásis em um país que insiste em ser um deserto tributário.
A federação brasileira está invertida. A União arrecada como um império absolutista, os estados sobrevivem no fio da navalha e os municípios são forçados a implorar, mês após mês, por transferências e convênios que mal cobrem as responsabilidades assumidas.
E aí está a ironia: a liberdade econômica em BH é um passo corajoso, mas insuficiente, se o Brasil continuar apostando na lógica da arrecadação sem contrapartida, da norma sem coerência, do Estado que cobra como empresa privada e entrega como repartição da década de 50.
É hora de o país decidir: vamos continuar tratando quem empreende como sonegador em potencial e vilão fiscal ou finalmente reconhecer que, sem o pequeno negócio, o Brasil para?
A liberdade econômica não pode ser só um decreto. Tem que ser um pacto entre governos, empresários, trabalhadores e sociedade. Um pacto em que o Estado deixe de ser dono e passe a ser parceiro. Porque o empreendedor brasileiro não quer favor: ele exige o direito de trabalhar sem grilhões.