Vamos falar um pouquinho sobre moradores de rua. A população em situação de rua de Belo Horizonte é sempre um tema difícil a ser abordado. A cidade enfrenta essa questão de maneira equivocada. E o grande entrave para enfrentar essa questão é o conjunto de medidas que são tomadas para adequar, melhorar e diminuir o número dos que vivem nas ruas.
No mundo inteiro, esse problema se agiganta, uma vez que essa questão não tem soluções simples. Só que o enfrentamento adotado por Belo Horizonte vai pelo caminho ideológico e dos discursos sem proposição. Estamos cedendo à propostas carregadas de um pensamento que atende, única e exclusivamente, a interesses que não são claros no caminho da resolução desse problema, que é central para a nossa relação de urbanidade.
Nós estamos diante de uma relação de humanidade e urbanidade comprometida por conta desse não enfrentamento técnico e prático. Hoje, nós temos estimados cerca de 15 mil moradores de rua em Belo Horizonte. Para se ter uma ideia, o número é superior à população de quase metade das cidades mineiras, segundo o IBGE.
O que se faz hoje é uma política paliativa, em doses homeopáticas, que não visa a solução do problema. É digno permitir que as pessoas morem nas ruas, nas condições em que estão morando hoje? Você passa nesses locais e o que vê é um acúmulo de pessoas em locais sujos, com mau cheiro, sem condição de permanência de um ser humano num lugar como aqueles.
A promiscuidade nas relações, a promiscuidade na habitação, a falta de zelo na forma de compreender a cidade… converse com comerciantes do Centro, da Floresta, do Barreiro, da Savassi, de qualquer região que tenha atividade comercial em Belo Horizonte. Pergunte a eles como são encontradas as portas das lojas pela manhã.
É normal que se ache isso um problema que não pode ser resolvido?
É normal que nós estejamos presenciando “cracolândias” sendo formadas em Belo Horizonte, sem que nada se faça?
É urgente a necessidade de um cadastro dessa população. Um levantamento com os dados publicados de quem são, suas origens, realidades, desejos. É preciso transparência na identificação de cada indivíduo e, daí, atuar em cada problema.
É urgente a criação de grupos multidisciplinares, não só com psicólogos e assistentes sociais, mas que tenham médicos, advogados, economistas, e que sejam propostas soluções factíveis, descontaminadas de ideologia e valores morais restritivos. São problemas que envolvem drogas, alcoolismo — que deve ser tratado como droga — desemprego, migração e imigração, enfim, a exigência de uma compreensão holística da questão e um encaminhamento prático da mesma tem que ser adotado imediatamente.
Não se trata de higienização, como os oportunistas querem tratar essa questão. É necessária uma intervenção determinada do poder público, que tem a obrigação de, em nome do coletivo, propor uma solução. Não se trata de expulsá-los. É para retirá-los das ruas, dando a eles um rumo.
É preciso a criação de abrigos que possam recebê-los com características distintas, e não transformar esses abrigos em depósitos de moradores de rua. Fazer com que esses moradores de rua tenham processos formativos para que possam ser empregados, colocados à disposição do mercado de trabalho, em parcerias com entidades de classe e empresas.
A Prefeitura diz que tem projetos como esse, mas, se observarmos os números, ficaremos envergonhados. Não adianta mais mentir para a população sobre o que está sendo feito como política para moradores em situação de rua. Nada está sendo feito. Belo Horizonte não está enfrentando essa questão. E os números de pessoas em situação de rua assustam.
O que é mais indigno? Fazer políticas intervencionistas que possam tirá-los e colocá-los em lugares com melhores condições ou deixá-los na rua? Onde está a maior indignidade? É necessário que os responsáveis por tais políticas públicas respondam a essas questões. Agir, atuar, interferir nessa realidade de maneira rápida.
Hoje, existe em Belo Horizonte um sem-número de organizações não governamentais que trabalham dando assistência à população em situação de rua, recebendo dinheiro público e até do exterior. Com boa parte delas fazendo “perfumaria”. Muitos dos que as administram fazem uso inadequado do dinheiro que recebem, até usando esse recurso em benefício deles mesmos.
Está na hora de o Ministério Público fiscalizá-las. Para que essas organizações permaneçam existindo, é preciso que façam parte da solução da questão dos moradores em situação de rua, e não que sobrevivam em função do dinheiro que recebem. Eu sei que essas informações incomodam os que tratam desse problema em Belo Horizonte, mas melhor do que se sentir incomodados seria que sejam impelidos a não se sentir acomodados.