O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter a validade da Lei nº 14.385/2022, que trata da devolução aos consumidores de valores cobrados indevidamente nas contas de luz. Essa devolução se refere a tributos que foram pagos a mais, especialmente pela inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/Pasep, o que, segundo entendimento anterior do próprio STF, foi considerado irregular. A responsabilidade de definir a forma como esses valores devem ser ressarcidos foi atribuída à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A discussão surgiu a partir da chamada “tese do século”, que reconheceu que o ICMS não pode ser considerado parte da base de cálculo de outros tributos federais, como o PIS e a Cofins. Esse entendimento abriu espaço para que valores recolhidos indevidamente pelas distribuidoras de energia, ao longo de vários anos, fossem restituídos. A dúvida era: a quem essa restituição pertence — às distribuidoras ou aos consumidores que, na prática, arcaram com esses valores na conta de luz?
A Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee) contestou a lei por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, alegando que ela feria princípios legais e impunha custos indevidos às empresas do setor. Para a associação, o reembolso desses valores deveria beneficiar as distribuidoras, que foram as responsáveis pelo recolhimento dos tributos e pelos processos judiciais ou administrativos que discutiram a devolução.
Por outro lado, a Advocacia-Geral da União e a própria Aneel defenderam a constitucionalidade da norma, destacando que os valores recolhidos a maior foram efetivamente pagos pelos consumidores e, portanto, devem retornar a eles. Segundo os argumentos apresentados, permitir que as distribuidoras ficassem com esses recursos geraria um enriquecimento sem causa, contrariando os princípios de justiça e equilíbrio nas relações de consumo.
A maioria dos ministros do STF acompanhou o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, que considerou legítima a atuação da Aneel na definição das regras para a devolução dos valores. Para o relator, a devolução configura uma política tarifária e, por isso, deve ser organizada pela agência reguladora do setor elétrico, que tem competência técnica e legal para isso. Ele destacou ainda que a lei não afronta o processo legislativo nem interfere indevidamente em direitos das distribuidoras.
Outro ponto importante definido pelo STF foi o reconhecimento de que, no momento da devolução, é possível descontar tributos incidentes sobre o valor restituído, bem como os honorários advocatícios pagos pelas distribuidoras nos processos judiciais que discutiram a devolução dos tributos. Com isso, busca-se equilibrar os interesses entre consumidores e empresas, evitando que um dos lados arque com custos que não lhe dizem respeito.
O Supremo também estabeleceu o prazo de dez anos para que os consumidores possam pleitear, na Justiça, a devolução dos valores pagos a mais. Esse prazo começa a contar a partir da data em que a distribuidora recebe os recursos da Receita Federal, seja por restituição ou por compensação tributária homologada. A definição desse marco temporal busca oferecer segurança jurídica e previsibilidade para todos os envolvidos.
Em paralelo à decisão do STF, a Aneel já havia definido, em julho de 2025, a metodologia que será aplicada para operacionalizar essa devolução. Os valores serão compensados diretamente nas contas de luz dos consumidores ao longo de 12 meses, por meio de descontos tarifários. Estima-se que cerca de R$ 44 bilhões já tenham sido ressarcidos, e, somente em 2025, o impacto da medida deve resultar em um abatimento de aproximadamente R$ 5 bilhões nas faturas de energia elétrica em todo o país.