Com 68% dos municípios mineiros operando no vermelho, a crise fiscal nas prefeituras virou prioridade no debate político estadual. Para o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Luiz Eduardo Falcão, a situação exige mais do que medidas pontuais. “Os municípios precisam se impor. Não podemos viver só de pequenas situações pontuais. É preciso discutir isso de forma séria”, afirmou em entrevista à 98 News nesta terça-feira (10/6).
A principal pauta no Congresso atualmente é a PEC 66, proposta de emenda à Constituição que prevê três medidas para aliviar a pressão previdenciária sobre os municípios: extensão automática das regras da reforma da Previdência nacional para cidades que ainda não aderiram, mudança do indexador da dívida previdenciária de Selic para IPCA e teto para precatórios.
“Ela representa um pouco mais de condição de respirar para os municípios, mas não é a salvação da lavoura”, disse Falcão. “Os municípios fecharam 2024 em déficit. Estão no vermelho. É um cenário muitíssimo preocupante.”
Déficit, envelhecimento populacional e pressão sobre os serviços
Falcão, que cumpre o segundo mandato à frente da prefeitura de Patos de Minas, argumenta que o colapso fiscal das cidades tem causas estruturais. Além da dívida previdenciária, há aumento constante de despesas obrigatórias — como o piso da enfermagem, o Fundeb e os custos de programas federais aplicados pelos municípios — sem a contrapartida adequada de repasses.
“As pessoas tinham oito, dez filhos. Hoje têm dois. A pirâmide etária mudou completamente. O Brasil vai passar a ser um país com muito mais idosos, e isso vai mexer com o setor público de uma forma nunca antes vista.”
O prefeito critica ainda o descompasso entre aumento de receitas e crescimento de despesas. Segundo ele, dados da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) mostram que a arrecadação municipal subiu 10% em 2024, enquanto as despesas avançaram 11,3%.
“Ah, é só cortar? Não conseguimos. O número de obrigações tem aumentado muito. O governo federal cria um programa e quem aplica é o município. Esse recurso vem atrelado à obrigação. Não tem margem.”
“O recurso não é do político. É do povo”
Para Falcão, a concentração de receitas em Brasília é a raiz do problema. Segundo ele, pouco mais de 10% do que é arrecadado em impostos permanece nas prefeituras. Mais de 20% fica nos estados e o restante — cerca de 70% — com a União.
“As pessoas não vivem em Brasília. Os ministros, deputados, senadores estão lá ditando regras, mas não estão com o pé no chão, no interior. O recurso não é do político. É do povo.”
Ele defende que o tema entre com força na pauta das eleições de 2026. “Nós prefeitos estamos cansados de ir a eventos e ouvir as mesmas coisas. É hora de mudar o pacto federativo de verdade”.
Criatividade, parcerias e pressão política
Enquanto a reestruturação não vem, o presidente da AMM afirma que cabe aos prefeitos buscar alternativas com criatividade. Em Patos de Minas, ele diz que a administração municipal adotou parcerias com a iniciativa privada para revitalização de espaços públicos, criou uma PPP de iluminação pública e mantém controle rígido sobre contratos e despesas.
“Tem um amigo que fala: ‘Custo é igual unha. Tem que estar sempre cortando, porque cresce de novo’.”
Falcão também destaca o papel das emendas parlamentares, que ganharam peso nos últimos anos, mas denuncia a desigualdade na distribuição. “Não é todo município que recebe emenda. Tem cidade que não tem nenhum deputado representando efetivamente. Isso engessa ainda mais o sistema.”
Discussões partidárias e o futuro político
Sem partido desde que deixou o Novo, Falcão vem conversando com lideranças de diversas siglas, entre elas o PSD. A decisão final, segundo ele, será tomada com calma, mas sem se afastar das discussões eleitorais.
“Sendo candidato ou não, a gente vai participar do pleito. Os municípios não vão aceitar só ficar cientes depois que tudo estiver pronto. Vamos sentar à mesa.”
O prefeito encerra a entrevista com um recado aos colegas gestores e à população: “O prefeito é um herói sem medalha. A gente media situações que muitas vezes nem são da nossa competência. Mas seguimos fazendo o possível para não deixar a cidade parar.”